15° Congresso Brasileiro de Clínica Médica e 5° Congresso Internacional de Medicina de Urgência e Emergência

Dados do Trabalho


Título

FATORES ASSOCIADOS À MORTALIDADE DO PACIENTE COM TRAUMATISMO CRANIOENCEFÁLICO MODERADO E GRAVE NA UNIDADE DE TERAPIA INTENSIVA DO HOSPITAL GOVERNADOR CELSO RAMOS

Fundamentação/Introdução

Traumatismo cranioencefálico (TCE) é definido, conforme o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC), como a alteração funcional do encéfalo causada por força externa e é marcado clinicamente por déficits de consciência, de memória e crises convulsivas1. A fisiopatologia do TCE é composta pela injúria primária, consequência de forças externas aplicadas ao crânio pelo resultado de impacto direto; movimentos de aceleração e desaceleração; objeto penetrante ou ondas de energia, levando a formação de hematomas intracranianos, de contusões cerebrais ou de injúria axonal difusa 2,3.
O TCE pode ser classificado de acordo com o mecanismo do trauma (fechado ou penetrante), ou conforme o tipo de lesão (focal ou difuso). Entretanto, a classificação com maior valor clínico e mais utilizada na prática, é a Escala de Coma de Glasgow (ECG) que se baseia na resposta neurológica aos estímulos, mensurada através de abertura ocular, resposta verbal e resposta motora. Pontuação na ECG de 13 a 15 classifica o TCE como leve, 9 a 12 como moderado e menor ou igual a 8 como grave 3,5.
O TCE é uma das principais causas de morte e incapacidade no mundo e acomete anualmente cerca de 1.7 milhões de pessoas resultando em 275 mil hospitalizações e 52 mil mortes 6, sendo os jovens a população mais prevalente 7-9. Em um recente estudo europeu de revisão, o TCE é considerado mais prevalente em menores de 25 anos e entre as pessoas com mais de 75 anos 10.
Aproximadamente 90% dos casos de TCE acontecem em países de renda média / baixa, como o Brasil 12,13, apresentando um perfil diferente em comparação com os países de renda alta. Dessa forma, nossa realidade engloba os mais jovens, predominantemente homens, com resultados anormais na tomografia computadorizada de crânio e, tendo como causa mais frequente os acidentes de trânsito 7,9.
Apesar dos avanços nos níveis de tratamentos intensivo e neurocirúrgico, o TCE permanece com elevada mortalidade e alto índice de incapacidade funcional 7, necessitando de uma abordagem complexa intra-hospitalar, com altos custos, que vão desde a estabilização inicial, procedimentos cirúrgicos até suporte ventilatório. 16
O trauma torna o cérebro mais vulnerável a agressões secundárias como, hipóxia e hipotensão, que estão fortemente associados a má evolução 17. Estudos como o “International Mission on Prognosis and Analysis of Clinical Trials in TBI (IMPACT study) ” 8 e o “Medical Research Council Corticosteroid Randomisation after Significant Head Injury (MRC CRASH study)” 9 demonstraram que idade, pontuação na ECG, anormalidades pupilares, classificação tomográfica de Marshall e glicose sérica são as variáveis mais relevantes para predizer os resultados mensurados seis meses após a ocorrência do trauma 8,18,19. Pesquisa envolvendo paciente com TCE grave em nossa população encontrou resultados semelhantes, corroborando com os estudos “IMPACT” e “MRC CRASH” 7.
No Reino Unido, através dos estudos “IMPACT” 8 e “MRC CRASH” 9, a mortalidade no TCE grave foi de 28% e 32% respectivamente, com incapacidade neurológica grave em 48% e 47% dos pacientes sobreviventes, respectivamente 18.
Há também outros escores criados para avaliar a probabilidade da morte hospitalar de pacientes adultos em unidades de terapia intensiva, com as características obtidas no primeiro dia, entre eles estão o APACHE (Acute Physiology and Chronic Health Evaluation), o SAPS (Simplified Acute Physiology Score) e o MPM (Mortality Prediction Model) 18, 20-22, mas que não demonstram boa acurácia para os pacientes vítimas de trauma.
Como justificativa desta dissertação temos que o TCE é a principal causa de morte e incapacidade funcional entre jovens, sendo um dos maiores problemas de saúde pública do Brasil e do mundo, com grandes repercussões social e econômica para os países de renda baixa e alta 6,10,11 . Trata-se de uma entidade patológica difícil de prognosticar, e tem-se realizado esforços para tentar predizer a mortalidade e o resultado funcional destes doentes 8,13,18,19.
Portanto, o objetivo do presente trabalho foi identificar os fatores associados à mortalidade em pacientes com traumatismo crânioencefálico moderado e grave na Unidade de Terapia Intensiva de um hospital de grande porte na região sul do Brasil.

Objetivos

o objetivo do presente trabalho foi identificar os fatores associados à mortalidade em pacientes com traumatismo crânioencefálico moderado e grave na Unidade de Terapia Intensiva de um hospital de grande porte na região sul do Brasil.

Delineamento e Métodos

Trata-se de um estudo epidemiológico descritivo e analítico retrospectivo, longitudinal. Foram observados pacientes com TCE moderado e grave, admitidos na unidade de terapia intensiva (UTI) do Hospital Governador Celso Ramos (HGCR). Os critérios de inclusão foram pacientes vítimas de TCE com escala de coma de Glasgow menor ou igual a 12 após a estabilização clínica na admissão da emergência, internados na UTI e devidamente registrados no Banco de Dados. Os critérios de exclusão foram pacientes menores de 14 anos. Os dados foram analisados através do software SPSS 17.0 (Chicago, IL, USA). As variáveis categóricas foram descritas em termo de número absoluto e frequências, as variáveis contínuas com distribuição normal foram descritas em médias e desvios padrão e, em medianas e intervalos interquartílicos (25-75) para as de distribuição não paramétrica.
As comparações entre os grupos de interesse foram realizadas através dos testes Qui-quadrado ou Fisher para às variáveis categóricas e através dos testes T de Student ou Mann Whitney para as variáveis contínuas e de acordo com sua distribuição. Considerou-se nível de significância o p<0,05.
Realizou-se a análise univariada relacionando as variáveis independentes com as variáveis dependentes de desfecho: tempo de ventilação mecânica, tempo de UTI, mortalidade na UTI e mortalidade hospitalar; calculando-se a razão de chance.
As variáveis que se mostraram associadas aos desfechos com o nível de significância menor que p<0,2 foram ajustadas através da analise multivariada, considerando-se como significativas as variáveis que se relacionaram aos desfechos com p<0,05 e calculando-se a razão de chance ajustada.

Resultados

No período de realização do estudo, foram admitidos na UTI 795 pacientes sendo que, destes 111 tinham o diagnóstico de TCE, sendo excluídos 12, considerados leves, resultando numa amostra de 99 pacientes com TCE moderado ou grave. Conforme pontuação de gravidade pela ECG, obteve-se 24 pacientes com TCE moderado e 75 com TCE grave.
O sexo masculino foi o mais prevalente, com 80,81% (80 pacientes) da amostra. A média de idade foi 38,38 anos e 62,63% (62 pacientes) pacientes não apresentavam comorbidades. Das comorbidades o tabagismo foi mais prevalente, encontrado em 12 pacientes, correspondendo 12,12% da amostra. Na tabela 1 podemos visualizar as características sociodemográficas da população estudada.
Foram encontrados 75 pacientes com TCE grave correspondendo 75,76% da amostra e 24 pacientes com moderado, totalizando 24,2% da população estudada. Dos 99 pacientes, 50 (50,5%) também apresentavam lesão extracraniana e todos foram triados pela escala T- RTS, sendo que 92% deveriam ter sidos admitidos em um centro de referência como o hospital do estudo.
Após estabilização dos pacientes na emergência, 21 (21,2%) apresentaram alterações pupilares.
Tanto a hipotensão, como a hipoxemia foram encontradas em 10 pacientes (10,1%). A média das glicemias encontrada foi de 156,1mg/dl, com desvio padrão de ±63,7.
A principal causa de TCE foi acidente de trânsito com 47 pacientes (47,4%). Dentre eles, o motociclístico foi o mais prevalente, 27 pacientes (27,2%). Como segunda causa, tivemos a queda de altura, com 21 pacientes (21,2%).
A HSA esteve presente em 61 das tomografias realizadas na admissão (61,62%) e a escala de Marshall foi determinada, demonstrando as lesões tipo II e III como as mais prevalentes, com 34 (34,3%) e 26 pacientes (26,2 %) respectivamente. As características clínicas estão descritas na tabela 2.
Os pacientes internados na UTI tiveram o CC como principal local de procedência, com 49 pacientes (49,4%). Esses tiveram em média um intervalo de tempo da chegada ao hospital até a admissão no centro cirúrgico de 24,7 horas (±59,2) e uma média de 28,8 horas (±50,4) entre a chegada ao hospital até a admissão na UTI.
Dos 49 pacientes que vieram do centro cirúrgico, 31 foram devido ao TCE (31,1%), enquanto que 18 (18,1%) necessitaram de abordagem cirúrgica devido a causas extracranianas.
Do total da amostra, 86 (86,8%) necessitaram de algum procedimento neurocirúrgico. A drenagem e ou a instalação de derivação ventricular externa (DVE) foi a neurocirurgia mais prevalente, realizada em 44 pacientes (44,4%) seguida pela instalação de PIC em 29 pacientes (29,2%) e, a craniectomia foi a menos prevalente, realizada em 13 pacientes (13,1%).
O SAPS 3 foi calculado na chegada à UTI com o índice de mortalidade média de 61,02% (±14,2) e com a mortalidade esperada de 50,51 (±25,0). As características clínicas na internação estão descritas na Tabela 3.

O tempo de ventilação mecânica (VM) médio foi 13,3 dias (±7,2).
A traqueostomia foi necessária em 47 pacientes (47,47%) e levou em média 10,4 (±5,04) dias para ser realizada.
Os pacientes permaneceram em média 14,5 (±7,7) dias internados na UTI e 30 pacientes (30,3%) foram a óbito durante a internação.
Ao analisar os fatores associados à mortalidade do TCE, encontramos 3 parâmetros significativos, independentes entre eles. Politrauma (p = 0,024) , pupilas alteradas (p < 0,001) e glicemia alterada (p = 0,02). Os demais parâmetros não apresentaram alteração estatística significativas. Todas as variáveis analisadas estão na tabela 4.

Conclusões/Considerações finais

O estudo foi realizado em um centro especializado em neurocirurgia e trauma, referência para TCE, em um hospital público na região metropolitana de Florianópolis. O corpo clínico apresenta condutas homogêneas dentro de sua especialidade e os exames de imagens (Tomografia Computadorizada, Arteriografia) são de fácil acesso e o centro cirurgico é preparado para receber esses pacientes, 24 horas todos os dias.
Os fatores associados à mortalidade dos pacientes com TCE moderado e grave na UTI em estudo foram semelhantes ao encontrado na literatura.
A presença de politrauma, pupilas alteradas e glicemia alterada, estiveram associadas independentemente à mortalidade de maneira estatisticamente significante.
São necessários estudos maiores e de seguimento dos pacientes após a alta hospitalar, a fim de melhorar nosso conhecimento sobre o assunto e diminuir a morbimortalidade associada a essa potencial grave condição.

Palavras-chave

Área

Clínica Médica

Autores

MARINA CASAGRANDE DO CANTO, EDUARDO AREIAS DE OLIVEIRA, VICTOR GABRIEL VIEIRA GONCHO, FERNANDO OSNI MACHADO, THIAGO M SAKAE, ISABELA SCHEIDT PRAZERES