XII Congresso Brasileiro de Regulação e 6ª Expo ABAR

Dados do Trabalho


Título

VIABILIADADE ECONOMICO-FINANCEIRA DOS SERVIÇOS DE AGUA E SANEAMENTO: BLOCOS REGIONAS DE SANTA CATARINA

Resumo

O Estado de Santa Catarina propôs onze blocos para regionalizar o os serviços de saneamento básico conforme estabelecido no novo marco legal, atualizado em 2020 (Lei 14.026; Decreto 10.710/2021). Será analisado a viabilidade econômico-financeira dos blocos regionais propostos, a partir de extrapolações definidas pelo decreto regulamentador (Decreto 1.372/2021). Foram analisados os indicadores definidos e projetados os fluxos de caixa descontados, considerando os investimentos necessários para universalizar os serviços de água e saneamento de acordo com as metas definidas na Lei. Os resultados demonstram a necessidade de revisão tarifária, ganhos de eficiência e subsídios, a fim de assegurar a universalização da cobertura do serviço e a modicidade tarifária.

Palavras Chave

Acesso universal. Capacidade econômico-financeira. Blocos regionais. Indicadores de capacidade econômico-financeira.

Introdução/Objetivos

Para conseguir atingir as metas de universalização dos serviços de saneamento até 2030, estima-se que será preciso o investimento de US$ 1.7 trilhão (Hutton e Varughese, 2016), três vezes o que já foi investido até 2016 (Kolker, Kingdom e Trémolet, 2016). É evidente que se trata de valores significativos, mas o montante deve ser colocado em perspectiva, pois quando comparado à economia global, representa “apenas” cerca de 0,10% do PIB total dos países de baixa e média renda (Perard, 2018). A maioria dos sistemas de saneamento, entretanto, não possuem viabilidade para efetivar os aportes necessários para que as metas do ODS sejam alcançadas (Nagpal et al., 2018).

Apesar dos avanços promovidos pela Lei nº 11.445/07, a população brasileira ainda enfrenta graves problemas de acesso aos serviços públicos de saneamento básico (Narzetti & Marques, 2021a). Além do baixo atendimento do serviço de saneamento no Brasil, somam-se altos índices de perdas operacionais e a necessidade de expressivos investimentos, estimados em mais de R$ 700 bilhões (KPMG and ABCON, 2020) para alcançar a universalização até 2033 ou 2040, conforme a hipótese legal definida na Lei 14.026/2020. O conceito de governança multinível utilizado pela OCDE representa o compartilhamento da formulação de políticas, responsabilidades, desenvolvimento e execução em diferentes níveis administrativos e territoriais (Akhmouch, Romano & Gammeltoft, 2017).

O limitado acesso aos WSS adequados tem entre suas origens o desalinhamento da governança do setor, representada por suas políticas públicas, instituições e regulação, conceituada como PIR, situação que tende a prejudicar um ambiente operacional propício e não estabelecer os incentivos adequados para alcançar esses objetivos (Mumssen et al., 2018). A universalização do serviço de saneamento proporcionaria enormes benefícios diretos e indiretos ao país. Segundo o Trata Brasil, espera-se que os benefícios ocasionados pela universalização alcancem cerca de R$ 1,5 trilhão em todo o país nos próximos vinte anos. Tais impactos decorreriam de efeitos diretos no setor, geração de emprego, renda e impostos ou pelos benefícios indiretos como redução dos custos com saúde, aumento da produtividade, valorização imobiliária, expansão do turismo e bem-estar social (KPMG & ABCON, 2020).

Diante desse cenário preocupante, o Congresso Nacional aprovou a Lei nº 14.026/2020 que, atualizando o marco regulatório, promove maior segurança jurídica aos investimentos por meio de um ambiente regulatório mais homogêneo e robusto (Narzetti and Marques, 2021b). Ainda, reduz significativamente as barreiras à entrada de agentes privados no setor, tanto por possibilitar a privatização de empresas públicas de saneamento básico, quanto por obrigar que se realize processo licitatório para a prestação do serviço. Pode-se dizer que a Lei nº 14.026/2020 veio estimular a concorrência com vistas à universalização do saneamento.

Objetivos da pesquisa:
• Aplicar a metodologia definida no Decreto Nº 10.710/2021 para analisar a capacidade econômico-financeira das concessões de saneamento básico dos municípios catarinenses de forma isolada e a viabilidade destes sistemas na modalidade de prestação regionalizada, agrupados pelas Regiões Metropolitanas – RMs de Santa Catarina, conforme Decreto Nº 1.372/2021, que define a estrutura da prestação regionalizada dos serviços de saneamento no Estado de Santa Catarina.
• Projetar e analisar o fluxo de caixa de cada sistema e avaliar a tarifa de equilíbrio para suportar os custos e os investimentos de modo a garantir o cumprimento das metas de universalização até o ano de 2033, sendo 99% da população com cobertura com água potável e 90% com coleta e tratamento de esgotos.
• Avaliar o comprometimento da renda média das famílias catarinenses com os serviços de água e esgoto, a fim de mensurar conceitos de modicidade tarifária e identificar necessidade direta de subsídios diretos ou cruzados.

Metodologia

Para a comprovação da capacidade econômico-financeira, os documentos consistem em: (i) cópia de contratos vigentes e minutas de aditivos que se pretende celebrar para o ajuste das metas previsto pelo § 1º, artigo 11-B da Lei 11.445, de 2007, acompanhadas de (ii) manifestação do titular anuindo com seus termos; (iii) estudos de viabilidade; (iv) balanços patrimoniais e demonstrações financeiras; (v) plano de captação de recurso, amparado em (vi) cartas de instituições financeiras que lhe deem lastro; (vii) demonstrativos de cálculos de indicadores econômico-financeiro; (viii) laudos ou pareceres técnicos de atestes dos cálculos e estudos elaborados pelo Prestador e (ix) listagem descritiva de todos os contratos por ele detidos.

Com base nesses documentos, a capacidade econômico-financeira do Prestador será avaliada em três fases sucessivas: (i) Fase 1: análise das condições econômico-financeiras mínimas do prestador; (ii) Fase 2: análise da viabilidade econômico-financeira do projeto; e (iii) Fase 3: análise da manutenção da viabilidade econômico-financeira do projeto. A reprovação em qualquer das duas primeiras fases resulta em não comprovação da capacidade econômico-financeira do prestador de serviço, dispensando a avaliação da fase subsequente.

Os indicadores econômico-financeiros do Prestador deverão ser calculados a partir das medianas dos dados extraídos dos balanços e demonstrações dos últimos cinco exercícios financeiros. Mediana é o valor que separa a metade maior e a metade menor de uma amostra, uma população ou uma distribuição de probabilidade. A aprovação do Prestador nesta fase estará condicionada aos indicadores resultantes desse cálculo atingirem valores referenciais mínimos fixados no decreto, quais sejam: (i) índice superior a 0 para margem líquida sem depreciação e amortização, (ii) índice igual ou inferior a 1 para grau de endividamento, (iii) índice superior a 0 para retorno sobre patrimônio líquido, e (iv) índice superior a 100 para índice de suficiência de caixa. Ver Tabela 1.

Tabela 1: Indicadores para comprovação da capacidade econômico-financeira, 1ª fase.

A análise de capacidade econômico-financeira realizada na Fase 2 foi feita em caráter estimativo, pressupondo a ocorrência de uma série de eventos futuros. A base desse planejamento está na capacidade de o projeto obter os recursos previstos, quais sejam, recursos próprios, capital de terceiros e, se houver, majoração tarifária e recebimento de subsídios. São eventos centrais à avaliação e que condicionam seu resultado, sobretudo porque fundamentam a expectativa de que o Prestador disporá de recursos necessários para fazer frente aos investimentos necessários à universalização.

Neste contexto, a Fase 3 objetiva confirmar a capacidade econômico-financeira do Prestador, averiguando se eventos que a condicionavam ocorreram, constatando a efetividade do Plano de Captação de Recursos e confirmando a efetividade de repactuações tarifárias ou subsídios eventualmente previstos nos estudos de viabilidade como fontes de recursos.

Resultados e Discussão

As projeções para viabilizar o acesso universal nas RM de SC demonstram grande necessidade de investimentos, além de otimizar os custos operacionais para gerar maior eficiência, bem como considerar a possibilidade de suavizar o ajuste necessário das tarifas atualmente praticadas. Cabe ao poder público exercer a governança sobre essas ações, mas como indica o novo marco legal, a transferência desses serviços para iniciativa privada poderá congregar maior eficiência e modicidade da tarifa aos consumidores.

Com base nas informações disponíveis, em uma análise preliminar observa-se que, das onze regiões metropolitanas propostas, apenas quatro são superavitárias em um ciclo de cinco anos (2015 a 2019). Essa condição demonstra que os projetos precisam considerar ganhos de eficiência, possíveis ajustes tarifários ou aporte de recursos públicos. A Figura 1 apresenta as regiões definidas pelo estado e os resultados operacionais do ciclo analisado.


Figura 1: Regiões Metropolitanas com análise dos resultados financeiros do ciclo 2015-2019

O comprometimento da renda média das famílias será analisado quando as projeções dos investimentos para universalização estiverem completas, avaliando a necessidade subsídios.

Conclusão

Com base nas informações disponíveis, foi possível avaliar a situação atual dos municípios de forma individual e agregados por RM. O resultado desta análise demonstra que apenas 4 RMs têm receita maior que seus custos, mas não são suficientes para suportar a necessidade de investimentos. Ao analisar o resultado entre a arrecadação atual e as saídas de caixa com os custos e investimentos realizados, apenas pelo prestador, nos últimos cinco anos, identifica-se que a receita atual não é suficiente neste período em nenhuma RM catarinense.

Para atingir as metas de universalização até 2033, os investimentos nos serviços de água e esgotamento demandam aportes vultosos. Para as regiões onde os projetos não demonstrarem viabilidade econômico-financeira em relação à capacidade de pagamento dos consumidores, será necessário apoio da União, dos Estados e dos municípios para assegurar o compromisso com o acesso universal. Esse entendimento acompanha o pressuposto estabelecido no Marco Legal.

Referências Bibliográficas

AKHMOUCH, A.; ROMANO, O.; GAMMELTOFT, P. Governance of Drinking Water and Sanitation Infrastructure in Brazil. n. November, p. 61, 2017.
HUTTON, G.; VARUGHESE, M. the Costs of meeting the 2030 Sustainable Development Goal targets on Drinking Water, Sanitation, and Hygiene Summary report. [s.l: s.n.]. Disponível em: . Acesso em: 6 fev. 2020.
KOLKER; KINGDOM; TRÉMOLET. Financing Options for the 2030 Water Agenda. [s.l.] World Bank, Washington, DC, 2016. Disponível em: . Acesso em: 2 fev. 2021.
KPMG, ABCON, 2020. Quanto custa universalizar o saneamento no Brasil? São Paulo.
NAGPAL, T. et al. Mobilizing Additional Funds for Pro-Poor Water Services. n. September 2018.
NARZETTI, D.A., MARQUES, R.C., 2021a. Access to water and sanitation services in Brazilian vulnerable areas: The role of regulation and recent institutional reform. Water (Switzerland) 13. https://doi.org/10.3390/w13060787
NARZETTI, D.A., MARQUES, R.C., 2021b. Isomorphic mimicry and the effectiveness of water-sector reforms in Brazil. Util. Policy 70, 101217. https://doi.org/10.1016/j.jup.2021.101217
PERARD, E. Economic and financial aspects of the sanitation challenge: A practitioner approach. Utilities Policy, v. 52, n. March, p. 22–26, 2018.

Área

Temas Transversais: Aspectos Jurídicos e Institucionais da Regulação; Transparência e Controle Social; Melhoria da Qualidade da Regulação; Governança Regulatória; Análise de Impacto Regulatório

Instituições

CERIS - - Portugal, UDESC - Santa Catarina - Brasil

Autores

DANIEL ANTONIO NARZETTI, WILLIAN CARLOS NARZETTI