XII Congresso Brasileiro de Regulação e 6ª Expo ABAR

Dados do Trabalho


Título

RESULTADOS DO IMPACTO REGULATORIO DA POLITICA DE MEIA ENTRADA CINEMATOGRAFICA NO SETOR AUDIOVISUAL BRASILEIRO

Resumo

Este trabalho busca avaliar o impacto regulatório da política de meia entrada cinematográfica no mercado audiovisual brasileiro. A política de meia-entrada cinematográfica pode ser definida como uma política pública voltada a promover, por meio de desconto, de 50%, do preço do ingresso, o acesso a bens culturais para parcelas da população que, via de regra, vivenciam maiores barreiras para consumir ou para ampliar o consumo de bens culturais. Para a verificação dos resultados, em primeiro lugar, foi analisado todo o arcabouço regulatório que trata a política de meia-entrada brasileira, isto é, as legislações federais, estaduais e municipais que somam mais de 50 leis que se sobrepõe e se acumulam na disciplina da meia-entrada no Brasil. Em seguida, foi verificado o impacto dessa política de desconto de preços no que se refere à evolução e desenvolvimento do mercado cinematográfico brasileiro, especialmente no que concerne ao Preço Médio do Ingresso (PMI), a evolução da bilheteria de filmes brasileiros, o alcance da política por faixa de renda, as estratégias adotadas pelos grupos exibidores, a taxa de crescimento do mercado e sua sustentabilidade no cenário pós-pandemia. Por fim, conclui-se que, da forma que é exercido atualmente, o amplo acesso ao benefício da meia-entrada cinematográfica acabou por tornar esta política pública inócua em relação aos seus resultados.

Palavras Chave

Política de meia-entrada cinematográfica. Regulação audiovisual. Regulação por preços. Dominância política regulatória. Teoria do interesse público e privado da regulação.

Introdução/Objetivos

A partir deste trabalho, pretende-se, como objetivo principal, avaliar o impacto regulatório da política de meia entrada cinematográfica no mercado audiovisual brasileiro. Com isso, busca-se fornecer subsídios à análise desta ação regulatória, de forma que se permita levantar o debate acerca dos rumos desta política vigente há quase vinte anos, assim como, as suas consequências para o segmento cinematográfico. A estrutura do artigo contém três seções, a primeira trata da abordagem teórica e evolução contemporânea da Regulação no país a partir das Teorias do Interesse Público e Privado da Regulação. Com isso, explica-se a moderna matriz regulatória com o casamento da concepção jurídica e econômica da regulação e suas perspectivas a partir de um novo modelo de atuação, com a classificação da política regulatória da meia-entrada cinematográfica. Na segunda seção, será analisado todo o arcabouço regulatório que trata a política de meia-entrada brasileira, isto é, as legislações federais, estaduais e municipais que somam mais de 50 leis que se sobrepõe e se acumulam na disciplina da meia-entrada no Brasil. Na terceira seção, verificar-se-á o impacto dessa política de desconto de preços no que se refere à evolução e desenvolvimento do mercado cinematográfico brasileiro, especialmente no que concerne: ao Preço Médio do Ingresso (PMI), à evolução da bilheteria de filmes brasileiros, ao alcance da política por faixa de renda, às estratégias adotadas pelos grupos exibidores, à taxa de crescimento do mercado e à sua sustentabilidade no cenário pós-pandemia.
Sabe-se que o consumo de cultura impacta o desenvolvimento econômico, tanto diretamente, através do financiamento do conjunto de atividades que integram a cadeia de valor de produção e distribuição de bens culturais, quanto indiretamente, ao contribuir para o desenvolvimento humano e socioeconômico dos indivíduos que consomem bens culturais. Muitos desses benefícios não são eficientemente precificados por mercados, constituindo externalidades positivas. Ao reconhecer tais externalidades, o Estado atuaria no sentido de incentivar tanto a produção quanto a circulação e o consumo de bens culturais. Desse modo, neste contexto, justificar-se-ia a criação de legislações que estipulam o direito à meia-entrada cinematográfica.

Metodologia

Para investigar essas questões, a metodologia utilizada consiste na revisão da literatura, na consolidação dos marcos legais sobre o tema e, também, através da análise qualitativa e quantitativa dos efeitos da política de preços praticada pelo desconto da meia entrada cinematográfica no país. Este artigo realiza uma análise dos dados de mercado referentes às hipóteses de meia-entrada legal, e de ingressos promocionais para, ao final, discutir alternativas e apresentar proposta voltada ao aperfeiçoamento e correção de eventuais falhas nessa política pública, exclusivamente para o mercado de salas de cinema.
Para isso, as políticas regulatórias foram estudadas com base nos relatórios consolidados das Agências disponibilizados pela Casa Civil. Também a experiência adquirida na área regulatória contribuiu para formação da abordagem acerca das principais diretrizes que norteou a atuação regulatória desta política no Brasil. Este trabalho utiliza os dados primários do Sistema de Controle de Bilheteria (SCB) da Agência Nacional de Cinema (Ancine) para avaliar os impactos na Indústria audiovisual da Regulação da meia-entrada cinematográfica brasileira. O manual do Sistema de Controle de Bilheteria – SCB apresenta, em seu Anexo II, as categorias possíveis de ingressos a serem declaradas em cada sessão cinematográfica.
Para efeito metodológico, os dados de código 04 foram designados como “meia promocional” , categoria na qual são declarados os bilhetes promocionais vendidos decorrentes de parcerias comerciais de grupos exibidores, cujo desconto é o de aproximadamente 50% em relação ao ingresso vendido na categoria “inteira”. Por paralelismo, dados de código 02 serão designados como “meia legal”, categoria na qual são declarados os ingressos vendidos com desconto previsto em lei (federal, estadual ou municipal). Os dados de ingressos declarados com os códigos 01 e 03 terão as seguintes designações “inteira” e “cortesia”, respectivamente. Sobre o último, resta informar que se trata de ingressos disponibilizados gratuitamente por distribuidores ou exibidores, isto é, não tem nenhuma informação de renda e, por isso, serão desconsiderados nos cálculos de preço médio do ingresso.

Resultados e Discussão

Por não ser baseada em critérios econômicos, a distorção estabelecida no mercado é evidenciada uma vez que quanto maior a proporção de ingressos vendidos sob meia-entrada, menor é o impacto real sobre a população beneficiada e maior é o valor do ingresso da categoria inteira. Em 2019 , aproximadamente, 80% dos ingressos foram de meia entrada: 59,75% legal , 17,27% promocionais e 2,34% cortesias. O amplo acesso a esse benefício tem como resultado elevar o preço médio do ingresso tornando esta política pública inócua, uma vez que quase a integralidade dos ingressos vendidos são “meia-entrada”. Nesse sentido, apesar da ampla abrangência, essa política não atende a parcela da população que não se enquadra nas hipóteses de direito à meia-entrada e que não possui condições econômicas de frequentar salas de cinema, visto que os critérios de acesso à meia-entrada não são majoritariamente baseados na renda.
Com efeito, como será demonstrado neste trabalho, a política pública colocada em prática por meio da meia-entrada cinematográfica acabou por gerar distorção no preço dos ingressos de cinema. Para ser efetiva, a política de meia-entrada deveria beneficiar um menor número de pessoas, pois, a proporção de ingressos com meia-entrada vendidos é essencial para o alcance dos resultados. Como será demonstrado, quanto maior a proporção de ingressos vendidos sob meia-entrada, menor é o impacto real sobre a população beneficiada e maior é o valor do ingresso da categoria inteira. Dessa forma, faz necessária a revisão dos critérios hoje adotados para a concessão do benefício da meia-entrada, de forma a deixá-los mais restritivos e focados em critérios que levem em conta majoritariamente a renda dos beneficiários, como forma de estender o acesso as obras cinematográficas à população com baixo poder aquisitivo, hoje excluída do consumo desse bem cultural, corrigindo as distorções observadas na política atual de meia-entrada e permitindo à retomada da taxa de crescimento do mercado, assim como, a sua sustentabilidade no cenário pós-pandemia.

Conclusão

Por fim, como será demonstrado neste trabalho, a política pública colocada em prática por meio da meia-entrada atualmente acabou por gerar distorção no preço dos ingressos de cinema. Ademais, o cruzamento de indicadores sociais, com os dados de bilheteria de cada ingresso vendido, mostram que ao invés de promover o acesso a bens culturais para parcelas da população que, via de regra, vivenciam maiores barreiras para consumir ou para ampliar o consumo de cinema, o amplo acesso a diversas categorias de meia entrada no país acabou por aumentar as barreiras de acesso à parcela da população que não se enquadra nas hipóteses de direito à meia-entrada e que não possui condições econômicas de frequentar salas de cinema.

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Área

Áudio Visual

Instituições

ANCINE - Rio de Janeiro - Brasil

Autores

LUANA MAIRA RUFINO ALVES DA SILVA, ELOIZA MARA DA SILVA