XII Congresso Brasileiro de Regulação e 6ª Expo ABAR

Dados do Trabalho


Título

ESTRUTURA DE GOVERNANÇA E ARRECADAÇAO DAS COMPANHIAS DE AGUA E SANEAMENTO

Resumo

Esse estudo objetivou analisar a associação da estrutura de governança e da performance de arrecadação das concessionárias de abastecimento e saneamento de água. Para alcançar esse objetivo, foram coletadas informações de natureza econômico-financeira dos relatórios financeiros e informações de natureza operacional do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS) de 63 concessionárias de abastecimento e saneamento de água brasileiras em painel longitudinal de 2013 até 2017. A estrutura de governança estudada foi limitada aos aspectos da propriedade e corporatização, ou seja, o aspecto de personalidade jurídica. Para as análises foram utilizados recursos de estimações econométricas, especificamente, as equações de estimações generalizadas (GEE). No aspecto da propriedade, os achados sugerem que a propriedade privada está associada a menores arrecadações, enquanto que em relação a corporatização, os resultados não sugerem associações significativas entre as presenças das concessionárias no mercado de ações e a performance de arrecadação. Com relação as variáveis de controle, a concessionária se localizar na região sul e a densidade da rede se associam com melhores arrecadações, enquanto se localizar nas regiões Norte, acessibilidade tarifária e cobertura do serviço sugerem piores arrecadações, sugerindo que tais peculiaridades locais e regionais deverão ser observadas pelos entes reguladores, conforme estabelece a Lei 11.445/07, atualizada pela Lei 14.026/20.

Palavras Chave

Arrecadação, estrutura de governança, abastecimento de água e saneamento.

Introdução/Objetivos

No Brasil, o serviço de abastecimento de água e saneamento básico têm sido controlados majoritariamente por companhias públicas, no entanto de acordo com Barbosa e Brusca (2015) isso está se modificando com o aumento da participação da iniciativa privada, na prestação desses serviços. Nesse contexto, as discussões envolvendo a eficiência das companhias público ou privadas entram em pauta, mais especificamente, se a gestão pública ou privada apresenta distinções significativas quanto a eficiência, redução de custos e demais métricas de interesse público. Contextualizando a questão, Barbosa e Brusca (2015) também apontam que as tarifas se configuram como uma forma de melhorar os serviços públicos, aumentar a eficiência do trabalho e proporcionar o melhor serviço possível para a sociedade. Apesar disso, deve-se considerar o ponto de vista dos autores, no que se refere ao aspecto social associado a cobrança tarifária.
Alguns estudos discutiram a gestão pública, tentando analisar como alcançar uma melhor performance (ARNABOLDI; LAPSEY; STECCOLINI, 2015), a eficiência dos modelos/designs tarifários (NAUGES; WHITTINGTON, 2017; LOPEZ-NICOLAS et al, 2018), e mesmo como aumentar a qualidade da água, sem impacto tarifário (PALOMERO-GONZÁLEZ, 2017).
A recente atualização da Lei 11.445/07 via promulgação da Lei 14.026/20 trouxe a tona o incentivo à abertura da concorrência para maiores captações de capitais privados para as concessões no setor.
Nesse contexto, o presente trabalho objetiva analisar a associação entre a estrutura de governança e a performance de arrecadação, a qual é mensurada pelo índice de evasão de receitas. A Estrutura de governança é relacionada nesse trabalho ao: controle da companhia, a qual pode ser privada (companhias com capital misto com gestão privada ou companhias privadas) e públicas (companhias com capital misto com controle público); e ser corporatizada (registrada na Comissão de Valores Mobiliários - CVM) ou não corporatizada.
JUSTIFICATIVA
Discussões recentes envolvendo privatizações tem ocorrido ao redor do mundo nos últimos anos e no que se refere ao setor de água e saneamento básico não é diferente. Nesse contexto, tem-se discutido essa temática (ESTRIN e PELLETIER, 2018). Já nos países desenvolvidos um cenário diferente se apresenta. Um movimento de remunicipalização está ocorrendo em diferentes regiões, especialmente, nos países europeus, nos quais o retorno para o controle público se deu pelas altas tarifas aplicadas sem o aumento efetivo na qualidade de serviço prestada pela iniciativa privada, bem como a baixa transparência (GONÇALVES, 2017).
De acordo com Estrin e Pelletier (2018), a privatização visa aumentar a eficiência dos serviços por meio da governança corporativa. Nesse sentido, com intuito de aumentar a eficiência ou dar um “sinal positivo” para o mercado, espera-se que companhias listadas na CVM apresentem melhores indexadores (melhores indicadores) do que as companhias não listadas. Dessa forma, o principal contributo desse trabalho é a análise de fatores que podem contribuir para melhores indexadores e, consequentemente, melhores serviços em termos de eficiência na arrecadação.

Metodologia

A amostra selecionada compreendeu as companhias privadas, de capital misto com controle público, de capital misto com controle privado, as quais foram listadas na base SNIS entre 2013 e 2017, 63 companhias, totalizando 218 observações, mas devido à ausência de informação, relatório financeiro não localizado e a presença de outliers foi necessário a remoção de algumas companhias da base de dados.
Para a análise da associação entre a estrutura de governança e o índice de evasão de receitas (proxy da performance da arrecadação), foi utilizado uma análise de regressão, por meio das equações estimadas generalizadas (GEE), esse que é uma extensão dos modelos lineares, utilizados na análise de dados em painel longitudinal. A variável dependente é o índice de evasão de receitas, como proxy para a performance na arrecadação, a qual foi coletada por meio da plataforma SNIS com o código de identificação IN029. Ela é expressa por meio da subtração entre as receitas operacionais totais e a arrecadação divididos pela receita operacional total. Alencar Filho e Abreu (2007), apontam que esse indexador é uma métrica precisa para mensurar a performance na arrecadação.
As variáveis independentes objeto do estudo que foram incluídas no modelo foram: corporatização e a propriedade, ambas variáveis dummy. A primeira foi indicado 1 para as companhias listadas na CVM e 0 (zero) para as companhias não listadas. Já a segunda foi dado 1 para as companhias com controle privado (companhias com capital misto com controle privado ou companhias privadas) e 0 para as com controle público (companhias com capital misto com controle público). A variável corporatização foi coletada manualmente por meio do sítio eletrônico da CVM e a variável de propriedade foi coletada, por meio do SNIS pela variável “Natureza Jurídica”. Outras variáveis de controle foram inseridas no modelo: 4 variáveis dummy regionais (NO, N, SE, S), acessibilidade tarifária, densidade da rede, cobertura da rede (regional ou micro), participação da população urbana, participação das economias residenciais.
De acordo com Sato (2013), a evasão de receitas está relacionada com a eficiência econômica, portanto, essas companhias (corporatizadas) almejam apresentar “bons sinais” (Teoria da Sinalização) para o mercado e o elevado índice de evasão de receitas, pode indicar uma falha nos controles ou práticas para garantir a entrada dos recursos, frente aos serviços prestados.
H1: Companhias corporatizadas estão associadas a melhores performances na arrecadação.
Berg (2010) apontou que a propriedade é uma das variáveis explicativas mais usadas nos estudos de estrutura de governança. Vale ressaltar que um dos problemas que originaram a discussão da privatização foi a falta de gestão e a apresentação de piores indicadores, nessa perspectiva Mello (2005) afirma que as perdas e os “calotes” eram elevados, consequentemente, espera-se no presente estudo que o controle privado apresente melhores resultados quanto a performance de arrecadação.
H2: Controle privado está associado a melhores indicadores de performance de arrecadação.

Resultados e Discussão

Por meio das análises das hipóteses formuladas, pode-se inferir que a H2 deve ser não rejeitada, enquanto que H1 deve ser rejeitada. Quanto a variável que diferenciava a propriedade/controle da companhia, a mesma se mostrou significante, o que indica uma superioridade do controle privado frente ao público, no que se refere a eficiência na arrecadação, reforçando o que foi levantado na construção da hipótese 2 do presente estudo. Já a variável corporatização não se mostrou significante dessa forma não se pode exprimir casualidade entre a mesma e a performance da arrecadação. Essa não significância pode ser ocasionada pela diferença entre companhias corporatizadas com controle público e corporatizadas com controle privado.
Em relação as variáveis de controle, a variável regional Norte e a acessibilidade tarifária se mostraram significativas e relacionam-se positivamente com a performance de arrecadação, já a variável regional Sul, a densidade da rede e a cobertura do serviço relacionam-se negativamente com a performance de arrecadação.
Sendo assim, o presente trabalho apresenta que apenas parcialmente a estrutura de governança afeta na performance de arrecadação.

Conclusão

Devido aos trabalhos incipientes relacionando a estrutura de governança e a performance de arrecadação, expressa no presente estudo pelo índice de evasão de receitas, a ideia de se investigar essa associação foi originada. Dessa forma, o presente estudo investigou se a estrutura de governança (corporatização e propriedade) apresentam alguma influência na performance de arrecadação (índice de evasão de receitas). O estudo analisou as companhias brasileiras de água e saneamento e compreendeu 63 companhias, de 2013 a 2017. Além disso, o modelo GEE foi usado para estimar os resultados e devido a variável dependente se categorizar como tempo dependente.
Os resultados mostraram que apenas parcialmente a estrutura de governança impacta na performance de arrecadação, haja vista que a propriedade se mostrou significativa, entretanto, a corporatização não foi significante para explicar as variações incorridas na performance da arrecadação.
No campo das políticas públicas e regulatórias, o presente estudo contribui ao levantar uma lupa sobre problemas na cobrança dos serviços prestados aos clientes e acessibilidade tarifária para os entes reguladores. Além disso, companhias com controle privado se mostraram melhores na cobrança dos serviços sugerindo que, ceteris paribus, a política governamental de incentivar a abertura da concorrência das operações das concessões ao capital privado por meio da Lei 14.026/20 foi acertada, mesmo considerando a indicação que as ofertas públicas na bolsa de valores para captação de investidores via corporatização não seja relevante para o desempenho na arrecadação dos serviços prestados.

Referências Bibliográficas

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Área

Temas Transversais: Aspectos Jurídicos e Institucionais da Regulação; Transparência e Controle Social; Melhoria da Qualidade da Regulação; Governança Regulatória; Análise de Impacto Regulatório

Instituições

ARSBAN - Rio Grande do Norte - Brasil, UFRN - Rio Grande do Norte - Brasil

Autores

FELIPE ANDERSON SMITH DE MEDEIROS, ALEXANDRO BARBOSA, FÁBIO RICARDO SILVA GÓIS, PEDRO CELESTINO DANTAS JUNIOR