XII Congresso Brasileiro de Regulação e 6ª Expo ABAR

Dados do Trabalho


Título

ANALISE DO PROCESSO DE INTERLIGAÇAO DE SISTEMAS DE ABASTECIMENTO DE AGUA NO DISTRITO FEDERAL

Resumo

Este artigo tem por objetivo discorrer sobre os benefícios da interligação entre sistemas de abastecimento de água. Os dados e informações apresentados são provenientes de duas interligações realizadas no Distrito Federal: entre o sistema Descoberto e o sistema Torto/Santa Maria, e, ainda em andamento, do sistema Torto/Santa Maria com o sistema Sobradinho/Planaltina. Conforme observado nos sistemas já integrados, a configuração obtida após a interligação permite maior flexibilidade operacional, tendo em vista que é possível a transferência de água dos pontos com maior disponibilidade para os locais com risco de descontinuidade no abastecimento. O advento da crise hídrica no DF entre 2016 e 2018 fez com que a interligação entre sistemas fosse considerada uma das medidas prioritárias para mitigação da crise, e assim, utilizando recursos da Tarifa de Contingência implantada no período, foram investidos aproximadamente R$ 22.000.000,00, permitindo um acréscimo de quase 10 por cento na vazão dos sistemas que receberam transferência de água.

Palavras Chave

Interligação, Abastecimento de água, Sistemas isolados, Flexibilidade operacional.

Introdução/Objetivos

Sistema de abastecimento de água é a instalação composta por um conjunto de obras civis, materiais e equipamentos, desde a zona de captação até as ligações prediais, destinada à produção e ao fornecimento coletivo de água potável, por meio de rede de distribuição. No Distrito Federal (DF) existem atualmente cinco sistemas de abastecimento de água (SAA), geridos e operados pela Companhia de Saneamento Ambiental do DF, Caesb. São eles o Descoberto, Torto/Santa Maria, Sobradinho/Planaltina, São Sebastião e Brazlândia. Os dois primeiros possuem uma interligação já consolidada. O sistema de São Sebastião está interligado com o sistema Torto/Santa Maria e recebe transferência de água em situações emergenciais. O sistema Sobradinho/Planaltina também está interligado com o Torto/Santa Maria. Trata-se de um projeto em execução, sendo que a primeira etapa foi concluída e a segunda está em andamento.
O SAA Sobradinho/Planaltina é o terceiro maior sistema do DF e fornece água para 4 Regiões Administrativas (RAs) do Distrito Federal: Sobradinho, Sobradinho II, Planaltina e Fercal. A água do sistema é proveninente de 8 captações superficiais (Paranoazinho, Contagem, Corguinho, Córrego Quinze, Mestre D ́Armas, Pipiripau, Fumal e Brejinho) e 72 subterrâneas (poços). A média de vazão produzida nos últimos doze meses foi de aproximadamente 720 L/s.
A produção do sistema tem apresentado déficit há alguns anos, sobretudo nos períodos de estiagem, afetando, inclusive, a disponibilidade hídrica das captações subterrâneas. Ocorrem então situações de descontinuidade no abastecimento à população, pois não há no sistema um reservatório para acúmulo de água, o qual poderia suprir a demanda quando não há incidência de chuvas.
O problema na região agravou-se durante a crise hídrica que afetou o Distrito Federal entre 2016 e 2018, sendo que em setembro de 2017 a Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento Básico do Distrito Federal - Adasa autorizou que se fosse implantado um regime de racionamento (Resolução Adasa n.º 21, de 08 de setembro de 2017), estabelecendo para concessionária a adoção das seguintes medidas: i) redução da pressão na rede de distribuição de água; ii) rodízio do fornecimento de água entre localidades de um mesmo sistema de abastecimento; e iii) paralisação parcial do sistema de abastecimento com vistas à redução da oferta de água.
Em busca de uma solução definitiva para o problema do abastecimento de água na região atendida pelo sistema Sobradinho/Planaltina, a Caesb propôs, em meio à crise hídrica do DF, uma alternativa que já havia sido implantada para os sistemas Descoberto e Torto/Santa Maria: a interligação entre sistemas. Por meio de conexão na rede de distribuição do sistema Sobradinho/Planaltina com o sistema Torto/Santa Maria (que dispõe de uma maior regularidade na oferta de água por contar atualmente com três reservatórios) seria viabilizada a transferência de água para aumento da oferta na região e diminuição do risco de desabastecimento mesmo em períodos de seca.
Uma das principais obrigações do prestador de serviços é a de garantir o abastecimento de água à população com qualidade e regularidade, e para que isso ocorra a operação de seu sistema precisa acontecer de forma eficiente. Tendo como tema principal a importância da busca pela manutenção do bom funcionamento do sistema de abastecimento de água gerido pelas concessionárias, o objetivo deste trabalho é discorrer sobre os benefícios da interligação entre sistemas de abastecimento de água. Para subsidiar a discussão do tema, será também apresentado um diagnóstico do sistema de abastecimento de água do Distrito Federal e o panorama dos investimentos em interligação de sistemas pelo prestador de serviços.

Metodologia

A metodologia utilizada no presente trabalho consistiu no levantamento de trabalhos científicos abordando o tema e análise de documentos, principalmente os que são provenientes da concessionária de abastecimento de água e esgotamento sanitário do Distrito Federal, Caesb, como notas técnicas, plano diretor e boletins operacionais.

Resultados e Discussão

A estiagem de 2016 reduziu drasticamente os níveis dos principais reservatórios da cidade (Torto/Santa Maria e Descoberto) fazendo com que a Barragem do Descoberto, responsável por atender quase 65% da população, chegasse a menos de 10% de sua capacidade.
A captação e distribuição de água no DF é dividida em 5 sistemas, os quais abastecem diferentes regiões do Distrito Federal. Os sistemas são o Torto/Santa Maria (integrado), Rio Descoberto (integrado), Brazlândia (isolado), São Sebastião (integração parcial) e Sobradinho/Planaltina (em processo de integração).
Ao observar a descrição dos sistemas de abastecimento do Distrito Federal, verifica-se que a infraestrutura existente antes da crise hídrica, de forma geral, atendia a demanda da população. A produção média de água em 2016 foi de 7.896 L/s, o que representava 82% da capacidade instalada de 9.662 L/s naquele ano.
Existia alguma integração da maior parte dos sistemas, mas que contemplava uma parcela pouco significativa da demanda das localidades. Assim, os sistemas São Sebastião e Sobradinho-Planaltina ainda eram tratados como sistemas isolados e os sistemas Descoberto e Torto/Santa Maria podiam ser tratados como sistemas integrados. O único sistema realmente isolado é o de Brazlândia.
Para mitigar os efeitos da crise hídrica, o DF adotou várias ações de caráter emergencial, sendo as principais a expansão do sistema de abastecimento (medida que propiciou o acréscimo de aproximadamente 1500 L/s na produção de água) e a interligação ou melhoria desta entre as redes de distribuição de alguns dos sistemas existentes.
As obras de integração tiveram como foco a implantação de capilaridade entre os sistemas, utilizando-se ao máximo a infraestrutura existente, complementada por interligações e obras de pequeno porte.
A interligação entre Descoberto e Torto/Santa Maria já havia sido implementada antes da crise hídrica, ocorrendo usualmente a transferência de água do primeiro para o segundo sistema. Com o aumento da disponibilidade hídrica no sistema Torto/Santa Maria, possibilitada pela implantação dos subsistemas Bananal e Lago Norte, cada um acrescentando 700 L/s ao sistema, e em virtude do maior deplecionamento no reservatório do Descoberto, foram realizadas então adaptações para a transferência no sentido reverso (500 L/s). A medida permitiu a criação do que foi denominado “região flex”, conjunto das áreas que poderiam ter seu sistema de abastecimento alternado, total ou parcialmente, a depender do balanço hídrico dos mananciais ou por conveniência operacional e de manutenção. Com a transferência de água para as localidades antes atendidas apenas pelo sistema Descoberto, evitou-se o colapso total do sistema, que se encontrava em situação crítica e não conseguiria garantir a continuidade no abastecimento à população.
No caso do sistema Sobradinho/Planaltina, foi desenvolvido um projeto para interligação com o sistema Torto/Santa Maria. O projeto foi dividido em 2 etapas, sendo que a primeira, com sua execução em andamento, permitirá uma transferência de até 95 L/s e a segunda, após concluída, um total de 370 L/s. As obras realizadas até o momento proporcionaram um acréscimo de 55 L/s, trazendo assim mais robustez ao sistema.
Foram gastos nas obras para melhorias na interligação do sistema Descoberto ao sistema Torto/Santa Maria o equivalente a R$ 15.600.000,00 e nas obras para interligação do sistema Sobradinho/Planaltina ao sistema Torto/Santa Maria R$ 7.400.000,00. Os recursos são provenientes da Tarifa de Contingência, estabelecida durante a crise hídrica e que consiste de um acréscimo na tarifa de água para o custeio de medidas voltadas ao enfrentamento do problema de abastecimento que afligiu o DF naquele período.
Há ainda um projeto apresentado pela Caesb para interligação do sistema Brazlândia ao sistema Descoberto. Assim como o sistema Sobradinho/Planaltina e o sistema São Sebastião, o sistema Brazlândia, que fornece água para a Região Administrativa de mesmo nome, não possui reservatório para acúmulo de água, tendo sido registrado em anos anteriores problemas no abastecimento por indisponibilidade hídrica, notadamente nos períodos de estiagem, quando a demanda não é suprida pelos dois principais mananciais utilizados (córregos Barrocão e Capão da Onça). De acordo com o projeto, a conexão propiciará ao sistema um aporte de 165 L/s. Como citado anteriormente, o sistema Brazlândia é o único que atualmente se caracteriza como isolado, e com sua interligação os cinco sistemas de abastecimento de água do DF passariam a ficar integrados.

Conclusão

A interligação dos chamados sistemas isolados foi acelerada durante a crise hídrica vivida no Distrito Federal em 2016 e 2017. Tais sistemas, por não serem servidos de reservatórios de regularização, ficaram mais vulneráveis à redução no regime de vazões de seus afluentes.
A infraestrutura existente até 2016 era suficiente para o atendimento da população do DF. O fato de, à época, mais de 65% da população ser atendida por apenas um reservatório, o do Descoberto, se mostrou como perigosa vulnerabilidade, demandando, com a crise, a busca por novas fontes e a interligação dos sistemas de abastecimento de água.
A interligação entre os sistemas Descoberto e Torto/Santa Maria, e entre estes e os chamados sistemas “isolados”, tais como Sobradinho/Planaltina, possibilitou a flexibilização e a otimização na distribuição da água tratada.

Referências Bibliográficas

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Área

Saneamento básico, recursos hídricos

Instituições

Adasa - Distrito Federal - Brasil

Autores

PABLO ARMANDO SERRADOURADA SANTOS, ADALTO CLÍMACO RIBEIRO