Datos del trabajo


Título

PARA UMA LEITURA COMPLEXA DE CORPO, SAUDE E MOVIMENTO

Introdução

A atividade física adquire uma posição privilegiada nos discursos de promoção da saúde baseados na adoção de estilos de vida saudáveis diante da atenção que existe no combate à inatividade física. A grande quantidade de estudos epidemiológicos que justificam campanhas e políticas públicas focadas na erradicação do sedentarismo são sustentadas por estudos quantitativos que procuram demonstrar como os efeitos, em termos fisiológicos da atividade física sobre o organismo, correspondem a uma menor probabilidade de contrair doenças crônicas e aumentar a expectativa de vida. Dentro do modelo biomédico, que reduz o corpo, com suas complexas dimensões, a organismo biologicamente definido e determinado, que pressupõe que a saúde de uma pessoa possa ser medida exclusivamente através avaliação de seus parâmetros fisiológicos, essa lógica causal consegue esgotar o problema produzindo uma série de soluções padronizadas e universais, detalhadas em intensidade, tempo e frequência de atividade física, necessárias para tutelar e preservar a própria saúde, alimentando estratégias de controle das condutas através da medicalização das práticas do cotidiano. Porém, considerando um conceito de saúde que leve em conta à complexidade de seus determinantes e as demais dimensões que, além da biológica, compõem o processo saúde doença e influenciam diretamente a prática de atividade física, essa abordagem resulta reducionista e simplificadora, uma vez que se preocupa apenas de uma parte do problema.
A articulação entre corpo, saúde e movimento pode aderir ou não à uma lógica dose-resposta. A abordagem simplificadora que encara a atividade física como um medicamento a ser prescrito e “tomado” de forma passiva, não consegue dar conta da complexidade deste fenômeno em relação ao processo saúde doença. É preciso sair do determinismo biológico e do reducionismo que caracteriza a ciência clássica, para explorar tal articulação e suas conexões com as políticas públicas de saúde de forma crítica e transdisciplinar. Não é intuito deste trabalho negar ou desacreditar a legitimidade dos estudos científicos sobre os efeitos da atividade física no organismo com relação às condições de saúde. Ao contrário, pretende-se integrar essa perspectiva em uma leitura complexa do papel e da potencialidade da atividade física no campo da saúde.

Objetivos

Refletir acerca da articulação entre corpo, saúde e movimento na perspectiva do paradigma da complexidade.

Desenvolvimento

O corpo-objeto, que a ciência construiu a partir da divisão cartesiana entre a res extensa, o mundo dos objetos, e a res cogitans, sede da razão, é um corpo reduzido a organismo que representa um mero instrumento, um suporte ao serviço da mente. O modelo biomédico insere-se neste recorte do real através seu determinismo biológico, sua causalidade linear e seu mecanicismo, estabelecendo padrões normativos para os conceitos de corpo, saúde e doença. O corpo torna-se seu objeto anatômico, uma máquina cujo movimento, fruto de ações e reações neuromusculares, é conhecido como atividade física. Além de pressupor a possibilidade de avaliar ou determinar a condição de saúde através da regulação dos parâmetros fisiológicos que constituem os padrões de risco para as doenças, a abordagem mecanicista para o corpo pode acabar medicalizando suas práticas e responsabilizar cada indivíduo para o cumprimento de seu “dever” cotidiano para a manutenção da própria saúde.
O processo saúde-doença pode ser considerado um objeto complexo de estudo devido a heterogeneidade dos níveis de análise e das dimensões que interferem na sua determinação. A articulação de sistemas vivos, ecossistema, representações, dispositivos de controle e de transformação social que o constituem, faz com que qualquer abordagem simplificadora que não consiga dialogar com a integralidade deste processo, apareça como uma mutilação da sua complexidade. As dimensões biológica, social, cultural e simbólica do corpo coexistem, mas não de forma dicotômica e inconciliável, pelo contrário: representam a simultaneidade do uno e do múltiplo. O corpo é eminentemente biológico, mas ao mesmo tempo é social, cultural, político, e se inscreve em um universo de linguagens próprias de cada realidade cultural, com seu imaginário de sentidos e significados em relação ao movimento e a saúde. Pensar de forma complexa a atividade física e seus aportes para saúde significa primeiramente, deixar de considerar a possibilidade de determinar essa última, partindo exclusivamente de pressupostos quantitativos e parâmetros fisiológicos e ampliar a concepção de causalidade para além do modelo linear. Tal ampliação dos conceitos de corpo e saúde significa considerá-los como um sistema aberto, capaz de auto organizar-se, inserido em um ecossistema de relações físicas, interpessoais, socioeconômicas, de mercado e de (bio)poder.

Considerações Finais

A complexidade de um corpo em movimento supera de fato a multidimensionalidade do ser ao mesmo tempo um ser biológico, social, cultural e político, pois o que nos move, são dimensões distintas, mas ao mesmo tempo indivisíveis. É nos sentidos e significados que levam a prática de atividade física que é possível indagar esta complexidade, e é na incerteza, na borrosidade e na não-linearidade da sua articulação com o processo saúde-doença que ela se manifesta. Observando nesta perspectiva a articulação entre corpo, movimento e saúde, é possível perceber como a ligação entre os processos orgânicos e celulares que acontecem durante uma atividade física e os significados atribuídos ao exercício com relação ao que cada um percebe como bem-estar, acontece de forma não linear e imprevisível, passando por respostas fisiológicas ao meio ambiente, construções culturais e fatores relacionais. Contudo, assumindo a complexidade desta articulação, é necessário integrar estas abordagens simplificadoras em uma visão que consiga contemplar suas coexistência e interdependência. O saber científico precisa descer de seu pedestal de conhecimento absoluto e isolado para tornar-se relativo e contextual. É necessário pensar seus objetos de forma integral, olhando para a unidade e ao mesmo tempo para a multiplicidade, assumindo a integridade sem descartar a diversidade. Assim fazendo, a saúde e a doença não poderão ser considerados como excludentes, mas diversos e unitários ao mesmo tempo, permitindo uma reavaliação dos nexos que as ligam a atividade física sob novos olhares, preocupados tanto com os diferentes modelos de causalidade, quanto com a contextualização das subjetividades dentro deste processo.
Morin E. Introdução ao pensamento complexo. Porto Alegre: Sulina; 2005. Tenbensel T. Complexity in health and health care systems. Soc Sci Med. 2013

Palavras Chave

Exercício Físico; Saúde; Complexidade

Area

Promoção da saúde

Autores

Leonardo Tonelli, Alessandra Xavier Bueno, Daniel Canavese Oliveira, Alcindo Antônio Ferla