Datos del trabajo


Título

ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA COM TRABALHADORES VULNERAVEIS: DESAFIOS METODOLOGICOS E CAMINHOS PROMISSORES NA PESQUISA QUALITATIVA

Introdução

A entrevista semiestruturada prevê a investigação da percepção dos participantes por intermédio de um instrumento de perguntas abertas e flexíveis que, se por um lado, mantém um foco e uma direção condizentes com os objetivos do estudo, por outro, permite que sejam elaboradas novas perguntas ao longo da pesquisa, de acordo com a direção que segue o discurso do sujeito.1 A entrevista semiestruturada é amplamente utilizada na pesquisa qualitativa em saúde, uma vez que possibilita a obtenção de dados científicos que estejam relacionados às experiências individuais, trajetórias de vida, percepções e sentimentos das pessoas. No entanto, quando o olhar científico se volta para os trabalhadores em situações de vulnerabilidade (como os trabalhadores informais e alocados em profissões precarizadas), é necessário discutir-se os desafios que os pesquisadores encontram na utilização da entrevista e os cuidados éticos que precisam ser reforçados no contato com estes grupos.

Objetivos

Sendo assim, o objetivo deste estudo é discorrer acerca dos desafios metodológicos e caminhos promissores envolvidos na utilização da entrevista semiestruturada com trabalhadores vulneráveis, a partir de uma experiência com catadores de materiais recicláveis.

Método

Pesquisa qualitativa, participativa, cujo objetivo geral foi conhecer e promover o autocuidado de catadores de material reciclável. O cenário do estudo foi uma associação de reciclagem do Sul do Brasil. Os participantes foram 18 catadores de materiais recicláveis que aceitaram participar do estudo. Os dados relatados neste trabalho foram produzidos de agosto a setembro de 2017 por meio de entrevista semistruturada.1 As entrevistas foram realizadas individualmente na sala destinada ao brechó da associação, a qual possuía mesa, duas cadeiras e garantia sua privacidade. Contou-se com um roteiro em forma de tópicos, os quais eram convertidos em perguntas-chave disparadoras. As entrevistas tiveram duração média de 28 minutos e foram audiogravadas, com anuência dos participantes. A análise dos dados seguiu os passos: apreensão, síntese, teorização e transferência. O estudo foi aprovado por comitê de ética em pesquisa local sob Certificado de Apresentação para Apreciação Ética 67058017.8.0000.5346, em conformidade com as Resolução 466/2012 e 510/2016 do Conselho Nacional de Saúde.

Resultados

A pesquisa qualitativa com trabalhadores vulneráveis apresenta um conjunto de desafios aos pesquisadores. A entrevista especificamente exige uma abertura do participante para a exposição de suas experiências, percepções e sentimentos. No contexto da vulnerabilidade, do trabalho precário e da exclusão social, deve-se considerar o compromisso ético que o pesquisador possui em relação a este espaço de produção de dados, e o vínculo que deve-se fortalecer para que o entrevistado esteja disposto a falar sobre sua trajetória e experiências de vida. Na pesquisa realizada com catadores de materiais recicláveis, a entrevista semiestruturada possibilitou o encontro da pesquisadora, não apenas com o grupo, mas com cada indivíduo que o compunha. Possibilitou o conhecimento das individualidades, das trajetórias de vida, dos sentimentos construídos pelo sujeito na experiência com o seu trabalho e com a sua saúde. A ambiência facilitou a interação entre a pesquisadora e os participantes. O lanche estava à disposição para que os trabalhadores se sentissem bem-vindos àquele espaço. Em especial, o chimarrão compartilhado confluiu para uma relação de horizontalidade e confiança, o que facilitou a abertura dos participantes para o processo investigativo. Assim, foi possível conduzir as entrevistas buscando profundidade e imersão, o que representa um desafio quando se considera que o tempo, na reciclagem, está intimamente relacionado com a produção. Há a necessidade que a entrevista semiestruturada seja discutida no meio acadêmico no que se refere aos seus quesitos metodológicos. A entrevista semiestruturada deve ser assumida e compreendida dentro de uma abordagem teórica, ou seja, não ser banalizada e aplicada sem sustentação teórico-metodológica.2 Neste sentido, acredita-se ser necessário pontuar os desafios metodológicos e os caminhos promissores no uso dessa ferramenta, visando à vigilância sobre o rigor metodológico. Considera-se que, no contexto dos trabalhadores vulneráveis, e em especial das populações que possuem baixa escolaridade, a estrutura e a linguagem do roteiro são determinantes para a sua compreensão. Neste sentido, a entrevista pré-teste foi uma decisão metodológica exitosa. Na entrevista pré-teste, a pesquisadora sentiu necessidade não somente de adequar o roteiro semiestruturado; o modo como os itens do roteiro são convertidos em perguntas é determinante para seu entendimento. Portanto, esse procedimento potencializou a consistência dos dados provenientes das entrevistas. No entanto, pode-se supor que uma limitação na aplicação dessa técnica tenha consistido em sua não validação por técnicos e especialistas. Há necessidade que o sistema de obtenção de dados pela entrevista semiestruturada seja apreciado por juízes, a fim de comprovar a sua coerência aos objetivos do estudo, consistência na elaboração dos tópicos e adequabilidade à população alvo. Esse procedimento potencializa a confiabilidade dos dados e a cientificidade do processo investigativo.2 Portanto, recomenda-se a realização desses procedimentos em investigações futuras. Por fim, ressalta-se que os cuidados éticos e bioéticos que envolvem a pesquisa com seres humanos devem ser considerados na investigação qualitativa, e de maneira particular junto aos trabalhadores vulneráveis. Deve-se atentar para o não julgamento, o respeito aos silêncios do entrevistado e uma postura ética e justa quando volta-se para realidades marcadas por privações econômicas e exclusão social. Sendo assim, a entrevista em profundidade com estas populações pode representar um caminho promissor para a investigação qualitativa, desde resguardados os cuidados éticos e metodológicos em sua aplicação.

Considerações Finais

A entrevista semiestruturada com trabalhadores vulneráveis representa um desafio na investigação qualitativa em saúde, uma vez que exige um reforço dos princípios éticos e elaboração cuidadosa do roteiro semiestruturado. No entanto, há caminhos promissores que incluem a ambiência e a criação de vínculo, as quais podem facilitar a aplicação desta ferramenta, possibilitando experiências exitosas junto a estes grupos.

Palavras Chave

1. Minayo MCS. O desafio do conhecimento – Pesquisa qualitativa em saúde. 8ª edição. São Paulo: Hucitec; 2010.
2. Manzini EJ. Uso da entrevista em dissertações e teses produzidas em um Programa de Pós-Graduação em Educação. NEMO. 2012;4(2):149-71.

Area

Saúde e populações vulneráveis

Instituciones

Universidade Federal de Santa Maria - Rio Grande do Sul - Brasil

Autores

Alexa Pupiara Flores Coelho, Carmem Lúcia Colomé Beck, Rosângela Marion Silva