Datos del trabajo


Título

EFEITOS DE UMA NOVA INTERVENÇAO PAUTADA NA ABORDAGEM “HEALTH AT EVERY SIZE®" NAS PERCEPÇOES DE MULHERES GORDAS ACERCA DO PRAZER ALIMENTAR

Introdução

A literatura científica aponta para o não sucesso em relação à estagnação/diminuição dos casos de obesidade no mundo, além de controvérsias sobre o modelo convencional de tratamento da obesidade. Novas condutas terapêuticas e de prevenção frente à obesidade tornam-se objetos de estudo, entre elas a abordagem Health at Every Size® (HAES®). A abordagem HAES® discute o prazer em comer como crucial para a promoção de saúde e sustentabilidade no manejo da obesidade. Contudo, a condenação cultural do prazer em paralelo à negligência do prazer no tratamento da obesidade forma um cenário de crítica, em que a mulher gorda é alvo de múltiplas desvantagens, entre elas a culpabilização do comer. Entendemos a necessidade em construir formas de atuação em que haja diálogo entre as diversas áreas de conhecimento; respeito à complexidade das tomadas de decisão do ser humano e o respeito aos valores culturais e simbólicos que o ser humano detém para com a comida. Assumimos, para este estudo, a importância de aprofundar-se nas relações entre novas perspectivas no cuidado à mulher gorda e o estímulo ao prazer em comer. Dentro dos nossos conhecimentos, este foi o primeiro estudo na literatura que analisou os efeitos da abordagem HAES® nas percepções sobre o prazer em comer de mulheres gordas.

Objetivos

Investigar as percepções de mulheres gordas acerca do prazer em comer antes e após uma intervenção interdisciplinar, não prescritiva e pautada na abordagem do HAES®.

Método

Tratou-se de um estudo qualitativo, inserido em um ensaio clínico randomizado controlado com seguimento de sete meses nos anos de 2015 e 2016. Incluiu 97 mulheres obesas de 25 a 50 anos de idade, com índice de massa corporal entre 30 e 39,9Kg/m², sendo alocadas em dois grupos: Intervenção e Controle. Ao final do estudo, trinta e nove mulheres concluíram no grupo Intervenção (62,90%) e dezenove concluíram no Controle (54,28%). Para os dois grupos, as atividades tiveram como linha condutora a abordagem do HAES®. O grupo Intervenção trouxe uma proposta original, com oferta de atividade física 3 vezes na semana (estruturada e acompanhada por professores e monitores de educação física), acompanhamento nutricional individual pela perspectiva do Aconselhamento Nutricional e oferta de discussões no formato de cinco oficinas filosóficas, com temáticas que percorreram o mundo da obesidade (como o mecanismo de desejo e tédio, restrição e saúde, moralização do corpo e da saúde, liberdade e ansiedade), ministradas por um filósofo e também educador físico. O grupo Controle baseou-se no modelo tradicional de aplicação da abordagem HAES®, com palestras expositivas bimestrais sobre comer saudável, atividade física e filosofia. A construção dos dados ocorreu a partir de grupos focais - quarenta e três mulheres participaram dos grupos focais finais (no grupo Intervenção = 32 – 82%; no grupo Controle = 11 - 58%). Interrompemos a oferta dos grupos focais quando as participantes não apresentavam mais disponibilidade no comparecimento. Para análise das transcrições dos grupos, foi realizado o método de Análise de Conteúdo Temática, sendo construídos temas pela técnica de Cutting e Sorting, os quais fundamentaram a argumentação teórica neste estudo. Ao longo do trabalho, assumimos as expressões "gorda/corpo gordo" em detrimento de termos típicos da área biomédica, como "obesas/corpo obeso", considerando sobretudo que o termo "gorda" foi mencionado pelas participantes enquanto mais condizente com a percepção corporal das mesmas, justamente pelo termo dar conta de um corpo que vai além do corpo fisiológico, e que alcança as perspectivas do corpo físico, do corpo psíquico, do corpo cultural e social.

Resultados

Vinte e três temas sobre as percepções do prazer em comer das mulheres estudadas foram construídos. A partir desses temas, discutimos as noções do prazer enquanto sentimento transgressor, regressor e identitário, além das implicações práticas das percepções sobre prazer em comer na forma de se alimentar das participantes. Após a intervenção, foram construídos, em maior grau no grupo Intervenção, temas sobre o aumento da percepção de reflexão sobre os próprios desejos alimentares e percepção de desculpabilização do prazer em comer, com implicações como: diminuição da sensação de comer automático ou hiperfágico; aumento da sensação de empoderamento para escolher o que e quando comer; aumento do prazer em comer acompanhada e aumento do prazer em comer comidas feitas por si própria, com escolhas mais frequentes de comidas não processadas, e dentro da lógica de "comida de verdade" apontada pelo Guia alimentar para a população brasileira.

Considerações Finais

A nova intervenção proposta promoveu efeitos positivos na relação das mulheres com o prazer em comer, evidenciando a desculpabilização do prazer em comer e melhora de outros aspectos da prática alimentar, como a comensalidade. Os efeitos percebidos deram-se sobretudo a partir do estímulo a um processo reflexivo sobre corpo, comida e saúde, ficando claro que o prazer em comer sem culpa é um desfecho necessário quando falamos da saúde da mulher gorda. Ressaltamos que nossos resultados devem ser contextualizados dentro da lógica de alimentação saudável e prazerosa do Guia alimentar para a população brasileira, o qual usamos como referência na condução do estudo, a fim de que nossos dados não sejam distorcidos e adaptados à lógica da indústria de ultraprocessados. Os resultados alcançados foram no nível individual, e em uma intervenção de curto prazo (sete meses), porém foi possível refletir e evidenciar a importância de novas condutas dentro da área de saúde, sobretudo no que tange à necessidade do uso de novas ferramentas de intervenção alimentar - não prescritivas e que valorizem e respeitem os desejos e prazeres em comer da mulher gorda - e ao estímulo a um olhar diferente para o corpo gordo e, consequentemente, para a forma de atuar com este corpo. Concluímos, assim, que o estímulo ao prazer em comer não se contradiz à promoção de saúde e pode ser uma ferramenta importante para transpor as barreiras do tratamento convencional da obesidade.

Palavras Chave

Prazer; Obesidade; Health at Every Size®; Intervenção não prescritiva; Mulher.

Area

Alimentação e Nutrição

Instituciones

Universidade de São Paulo- USP - São Paulo - Brasil

Autores

Fernanda Sabatini, Fernanda Baeza Scagliusi