Datos del trabajo


Título

“A SAUDE NAO DEBATE, NAO DISCUTE CORPOS TRANS”: HISTORIA ORAL DE VIDA E EXPERIENCIAS NO SUS DE TRANSEXUAIS E TRAVESTIS EM UMA CIDADE DO INTERIOR DE SAO PAULO.

Introdução

Travestis e transexuais, apesar de diversas legislações que vêm sendo criadas, ainda encontram inúmeros obstáculos para ter acesso ao sistema de saúde e passam por um processo de estigmatização que acaba por gerar atos de violência e muitas vezes até a morte. Somando-se a isso, essas pessoas são excluídas do convívio social, das instituições de ensino, do mercado de trabalho e também dos serviços de saúde, tendo seus direitos na maioria das vezes negados por completo1. Uma das consequências da transfobia é que travestis e transexuais ainda estão muito distantes dos serviços de saúde, principalmente daqueles oferecidos pelo SUS, e muito desse afastamento se deve à falta de estratégias que tornem o acesso dessa população mais fácil e confortável. Essas pessoas, muitas vezes se automedicam, pois sabem que sofrerão discriminação e preconceito ao chegarem a esses serviços e que possivelmente serão atendidas (os) por profissionais que não possuem qualquer conhecimento sobre as suas especificidades e necessidades1. Há uma escassez preocupante de produções acadêmicas a respeito do universo LGBTT, principalmente no que diz respeito à saúde da população de transexuais e travestis. É, portanto, essencial que se amplie o conhecimento sobre essas questões e que se dissemine tais informações entre a comunidade acadêmica2.

Objetivos

Este trabalho teve como objetivo, portanto, conhecer a história de vida e trajetórias no SUS de homens e mulheres transexuais e travestis e conhecer a visão e as experiências de travestis e transexuais a respeito dos serviços oferecidos pelo Sistema Único de Saúde com o objetivo de gerar conhecimentos que deem subsídios para que intervenções possam ser feitas e que o acesso dessa população à saúde, seja facilitado através de profissionais capacitados a atender as suas necessidades e especificidades.

Método

Esta é uma pesquisa que teve como referencial a História Oral que é um recurso, essencialmente qualitativo, que torna possíveis estudos a respeito das experiências sociais de pessoas ou grupos, valorizando populações excluídas e marginalizadas e, através dela, minorias discriminadas vêm ganhando espaço para que suas vozes possam ser ouvidas e suas experiências validadas em contraposição ao silenciamento que vivenciam diariamente na sociedade3. O ponto de partida da história oral são as entrevistas, que são divididas em etapas: pré-entrevista, entrevista e pós- entrevista. Meihy e Holanda3,apontam que a transformação das gravações em documentos escritos também exigem cuidados rigorosos e devem passar pelas etapas de transcrição absoluta, textualização e por último, transcriação. Esse estudo seguiu esses passos e foi realizado em uma cidade do interior de São Paulo, Brasil, com população aproximada de 240 mil habitantes. O número de participantes da pesquisa foi determinado de acordo com o necessário para que o objetivo fosse alcançado e o fenômeno sob estudo, compreendido. Tivemos a participação de quatro colaboradores/as, sendo suficiente para atingir os objetivos propostos.

Resultados

: A leitura das narrativas permitiu encontrar muitos pontos em comum, que são de extrema importância e que foram separados em temas e discutidos de forma dialógica: Se entender, se descobrir transexual ou travesti: “era muito difícil agir, era muito difícil existir”; A falta de visibilidade e a discussão que não chega à periferia: “a gente não tinha referências, e acho que não temos ainda”; As subjetividades e a sexualidade: “destruíram as minhas subjetividades e moldaram aquilo que eles queriam que fosse!”; Transfobia e violência: “Eles fazem o papel de inquisição, só que os instrumentos de tortura não eram físicos, eram psicológicos.”; O papel das instituições sociais: “a sociedade ainda não está pronta para aceitar corpos desviantes, corpos que desviam a regra”; O ciclo das violências: “a gente vive o ciclo da violência, e ela é terrível”; Saúde de quem e para quem: “A saúde não debate, não discute corpos trans.” As trajetórias nos SUS das colaboradoras e colaboradores desse estudo se mostram cheias de desafios, ora parecem não acontecer, ora são permeadas por violências. Alguns serviços mostram mudar de direção quando profissionais da saúde que compõem estes locais se sensibilizam e se abrem para aprender e ouvir as vozes que não são ouvidas. As vozes que cotidianamente são silenciadas. Fica evidente que as lacunas existentes se iniciam na formação profissional, já que os cursos da área da saúde não discutem e não debatem questões de sexualidade e identidade de gênero, formando profissionais que continuam replicando e reproduzindo visões biologicistas, patologizantes e estigmatizantes sobre a população LGBTT, em especial sobre a população de transexuais e travestis.

Considerações Finais

A história oral de vida nos permitiu adentrar e conhecer a realidade e as vivências de pessoas transexuais e travestis de maneira ampla através de suas narrativas. Ao perpassar por suas histórias, contadas de maneira única por cada colaboradora e colaborador, e ouvir as vozes que muitas vezes são silenciadas pela sociedade cis-heteronormativa em que vivemos, é possível ampliar o olhar para a saúde desta população a partir de suas necessidades e especificidades reais. Esta pesquisa pôde mostrar os obstáculos e percalços enfrentados pela população T na busca por atendimentos qualificados e respeitosos em saúde e iluminar os caminhos para que profissionais, docentes e discentes dos cursos da saúde busquem oferecer uma assistência universal, integral e equânime de acordo com os princípios do Sistema Único de Saúde. É necessário e urgente que haja uma sensibilização de gestores e profissionais de saúde em relação à população de travestis e transexuais para que se identifiquem as suas necessidades e especificidades e que suas demandas sejam respeitadas e atendidas.

1. BRASIL. Transexualidade e travestilidade na saúde. Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa. Departamento de Apoio à Gestão Participativa., v. 1, p. 194, 2015.
2. Santos AR, Santos RMM, Souza ML, Boery RNSO, Sena ELS, Yorld SD. Implicações bioéticas no atendimento de saúde ao público LGBTT. Rev. Bioét. 2015; 23(2):400-408.
3. Meihy, José Carlos Sebe Bom; HOLANDA, Fabíola. História Oral: como fazer como pensar. 2. ed. São Paulo: Contexto, 2015. 175 p.

Palavras Chave

Gênero; Sexualidade; História Oral; Atenção Integral à Saúde

Area

Gênero, Sexualidade e Saúde

Instituciones

Universidade Federal de São Carlos - São Paulo - Brasil

Autores

Mariana Rigolon, Natália Rejane Salim, Bianca SantAnna Queiroz, Erika Santos Silva, Gustavo de Oliveira Nazareth, Erick da Silva Gregner