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Título

A EXPRESSÃO DA ESPIRITUALIDADE NA VIVÊNCIA DE MULHER JOVEM EM SEU ADOECER E MORRER POR CÂNCER DE MAMA

Introdução

A ênfase curativa resiste no escopo das diversas profissões na área da saúde, entre elas, a enfermagem, ainda que tenha a concepção do cuidado como essência de suas práticas e objeto de estudo de suas teorias. Percebemos, no entanto, certa opacidade no que tange o cuidado à pessoa quando não há mais possibilidade de reverter o curso natural de evolução da doença. Carecemos, dentre outras, da incorporação da ideia de cuidado que se relacione ao sofrimento próprio do humano, assumindo e reconhecendo-o como único, posto que é singular a cada pessoa, e, ao mesmo tempo, plural e diverso já que se reveste de inúmeras possibilidades de amparar a vulnerabilidade do momento vivido. Tal complexidade é mais agudamente colocada a vista quando da instauração de um adoecimento crônico com agravamento progressivo e esgotamento gradual de possibilidades curativas. Especialmente, nestas situações, é fundamental se considerar as múltiplas dimensões da vida humana, afloradas, em novos matizes, face a possibilidade próxima da morte. É dessa natureza a dimensão espiritual, aqui tomada na expressão da espiritualidade, que carrega em si, dentre outros, o potencial de aliviar e dar sentido ao sofrimento1.

Objetivos

Compreender os modos de expressão da espiritualidade na vivência de mulher jovem em seu adoecer e morrer por câncer de mama.

Método

Assumindo postura compreensiva, empregando a História de Vida que foi operacionalizada pela Entrevista em Profundidade, para apreender a vivência de Beth, mulher jovem que aos 28 anos foi diagnosticada com câncer de mama e que morre aos 35 anos, no período de finalização do trabalho de campo. Foram realizados 09 encontros de entrevista, que, tendo sido gravados em sua maioria, foram transcritos e, juntamente com a observação de campo, compuseram o Diário de Pesquisa2 de Beth. Do conjunto do material empírico foi dado relevo intencional aos sentidos e significados atribuídos por Beth às experiências por elas vividas e que nos remetiam à transcendência e os modos de expressão da espiritualidade no cotidiano do seu viver, do adoecimento e do morrer. As narrativas que nos ‘saltaram aos olhos’ foram, então, destacadas da história de vida e constituíram o corpus de análise deste estudo. O processo analítico se deu por meio da construção de diagramas ordenadores e sintetizadores da experiência de Beth, viabilizando elencar três eixos de sentido: 1) quem é o Deus de Beth?; 2) O agir de Deus na vida de Beth e 3) A esperança ancorada na fé em Deus. A pesquisa matricial a qual este estudo se vincula foi aprovada pelo Comitê de Ética sob nº 671/CEP-HUJM/09.

Resultados

Após inúmeras intervenções terapêuticas para controle do câncer e dos sintomas, Beth ainda sentia fortes dores no corpo e intensa dificuldade respiratória devido ao processo metastático que já atingia ossos e pulmão. Ela nos falava constantemente da presença de Deus em sua vida, utilizando expressões que remetiam a sua fé e crença em uma transcendência que pudesse explicar ou significar aquilo que estava vivenciando. Ao indagarmos (1) “Quem é Deus na vida de Beth”, pudemos apreender a imagem de Deus como grande interventor e ordenador, operador de milagres, imprimindo coerência e significado ao seu viver e adoecer. Assim, (2) “o agir de Deus na vida de Beth” se manifesta como ações determinantes sobre seu destino, de forma pragmática. As situações de sua vida, dentre elas o adoecimento por câncer de mama, ganham a condição peculiar de ‘provação’, ou seja, como necessárias à sua vida. A ela cabe o dever de ser capaz de superar as intempéries com a finalidade de dar seu testemunho de fé as outras pessoas. Nesse cosmos individual, (3) “a esperança ancorada na fé em Deus” se constitui em grande sustentadora da vida de Beth, tanto no plano físico como transcendente. E, diante do prognóstico sombrio de sua doença, a fé permitiu a sustentação da esperança que alicerçava sua vontade de resistir e manter o equilíbrio possível em seu cotidiano.
Durante os cinco anos de tratamento, Beth viu a cura e a morte de outras pessoas com o mesmo diagnóstico que o dela e, apesar de já estar bastante adoecida, pautando-se na esperança em relação à cura, foi capaz de viver com certa qualidade por um significativo período de tempo. Assim, concordamos que a espiritualidade atribui sentido à vida e produz a capacidade de suportar sentimentos de culpa, raiva e ansiedade3. E, apesar de se manifestar fortemente vinculada a figura de um Deus ordenador e interventor, extrapola em si mesma, as amarras de um futuro predeterminado e se configura como modo de preencher os espaços vazios, as lacunas e as incertezas de um futuro em vida ou não.

Considerações Finais

A espiritualidade se mostrou, portanto, encarnada na vida de Beth, produzindo efeitos reais e concretos em suas possibilidades de lidar com a doença, bem como, com os muitos sofrimentos carreados pelo prognóstico de morte determinado pelo câncer. Propiciou-lhe, também, vivenciar o morrer de maneira serena e lúcida, estando presente em sua vida até o último instante. Isso nos levou a compreender que a produção de cuidado, especialmente em situações de extrema vulnerabilidade, como o adoecimento e morte por câncer de mama, deve se ancorar no todo da vivência da pessoa a ser cuidada, incorporando o real sentido da frase citada por Koenig4: “Curar algumas vezes, aliviar frequentemente, confortar sempre”.

Palavras Chave

Referências:
1. Delgado-Guay MO, Hui D, Parsons HA, et al. Spirituality, religiosity, and spiritual pain in advanced cancer patients. J Pain Symptom Manage. 2011; 41(6): 986–94.

2. Araújo LFS, Dolina JV, Petean E. Musquim CA, Bellato R, Lucietto GC. Diário de pesquisa e suas potencialidades em pesquisa qualitativa. Rev Bras Pesq Saúde. 2013 Jul-Set;15(3):53-61.

3. Guerrero GP, Zago MMF, Sawada NO, Pinto MH . Relação entre espiritualidade e câncer: perspectiva do paciente. Rev Bras Enferm, Brasília. 2011 jan-fev; 64(1): 53-9.

4. Koenig HG. Religion, spirituality, and medicine: application to clinical practice. MSJAMA – JAMA 2000; 284(13):1708.


Palavras-chave: Cuidado à saúde; Espiritualidade; Cuidados paliativos na terminalidade da vida

Area

Doenças crônicas/condições crônicas

Instituciones

Universidade Federal de Mato Grosso - Mato Grosso - Brasil

Autores

Janderléia Valéria Dolina, Juliana Soares Androlage, Roseney Bellato, Laura Filomena Santos de Araújo