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Título

A IMPLANTAÇAO DA CLASSIFICAÇAO DE RISCO EM UM HOSPITAL BRASILEIRO: UMA AVALIAÇAO PARA ALEM DE SUA DIMENSAO TECNICA ASSISTENCIAL

Introdução

O contexto atual de organização do Sistema Único de Saúde, mesmo com os avanços e progressiva expansão da atenção primária nas últimas décadas, tem demostrado ser ainda crucial a contribuição dos hospitais para a realização da integralidade do cuidado. O serviço de urgência e emergência, dentre as áreas de produção do cuidado no hospital, destaca-se como espaço particularmente importante e complexo, motivo pelo qual o Ministério da Saúde tem definido, de modo crescente, políticas especificas para a área. A modificação do perfil epidemiológico e de morbi-mortalidade nas áreas metropolitanas, em particular o crescimento da importância das causas externas, resultou em maior relevância do atendimento de urgência e emergência e tem apontado para a desproporção entre a demanda dos usuários que chegam aos serviços e a capacidade de oferta de atendimentos. Sendo assim, a necessidade de agilidade no atendimento não apenas como um meio de minimizar o problema da superlotação, mas principalmente o de aliviar o sofrimento e salvar vidas, torna o trabalho nesses serviços especialmente desgastante e tenso para usuários e trabalhadores. A adoção de ferramentas com potencialidades para intervir sobre o processo de trabalho nos serviços de urgência e emergência pode viabilizar o alcance de um novo ordenamento no cotidiano do hospital, na perspectiva de legitimação e atendimento das necessidades dos usuários e de suas demandas, negociadas e conciliadas, na medida do possível, com a dos profissionais. É nesse contexto que surge o Acolhimento com Classificação de Risco como uma das alternativas possíveis para qualificar as “portas dos Serviços de Emergências”, apresentando-se como dispositivo tecno-assistencial de intervenção sobre o modo de produção do cuidado.

Objetivos

Caracterizar as percepções, dificuldades e mudanças no cotidiano dos profissionais responsáveis pela operacionalização da implantação da Classificação de Risco por meio do Sistema de Triagem de Manchester (STM) e verificar os impactos dessa implantação na micropolítica do hospital.

Método

O estudo, de caráter qualitativo, analisou a implantação da classificação de risco, por meio do STM, a partir dos relatos dos profissionais envolvidos diretamente em sua operacionalização. Foram utilizados os seguintes procedimentos metodológicos: a) diário de campo, a partir da observação participante e da coleta de depoimentos nos meses iniciais de implantação da nova sistemática de trabalho; b) grupo focal com equipe multiprofissional, oito meses após a implantação do STM; d) entrevistas não estruturada com dois médicos que trabalham no pronto-socorro diariamente e com dois atores externos ao hospital que participaram da formulação da política no Estado de Minas Gerais; e) levantamento documental tais como relatórios gerenciais e documentos oficiais. Utilizou-se da produção da literatura disponível sobre sistemas de classificação de risco, em especial do Sistema de Triagem de Manchester, e da produção científica que discute o complexo território micropolítico das organizações em geral e do hospital em particular.

Resultados

A equipe multiprofissional faz uma avaliação positiva do STM, resultando em melhor definição das regras e fluxos de trabalho e maior conhecimento do perfil de pacientes. A classificação de risco amplia a possibilidade de acesso ao serviço de emergência, ao mesmo tempo em que evidencia a já conhecida desproporção entre a demanda e a capacidade de oferta de atendimento. A baixa articulação do serviço de emergência do hospital com a rede de serviço de emergência e com a atenção primária resulta em grande demanda de atendimento e interferem negativamente na operacionalização do STM; O STM é uma estratégia gerencial que interfere na autonomia do trabalho médico, em particular quando a priorização e a ordem do atendimento passam a ser definidas pelo profissional de enfermagem segundo determinação do protocolo, funcionando como um dispositivo institucional de regulação e controle interposto entre o médico e o paciente acentuando elementos prévios de tensão entre a equipe médica e a de enfermagem causando conflitos de autoridade com transformação dos papéis tradicionais desses profissionais. O atendimento de pacientes triados na categoria menos urgente num hospital de complexidade elevada, como é o caso do estudado, causa descontentamento entre os profissionais, tensão e conflitos na sala de espera, prejudicando o atendimento dos pacientes com maior necessidade clínica. A realização de treinamento dos profissionais não é só uma questão de capacitação técnica, mas, sobretudo, uma estratégia de mobilização e envolvimento dos profissionais com o processo de implantação. A estrutura física é um componente essencial para a organização dos fluxos internos, para a otimização dos recursos materiais e humanos, visando oferecer condições de atendimento segundo critérios de humanização da assistência. A implantação da classificação de risco mobiliza toda a equipe do hospital e interfere em outros setores, particularmente no serviço de apoio diagnóstico e requer não só a anuência da direção do hospital, mas seu envolvimento direto no processo de implantação para intervir sobre os problemas, agilizar a tomada de decisão e legitimar a classificação de risco como política institucional.

Considerações Finais

Nos serviços de urgência, coexistem relações de colaboração e complementaridade entre as duas corporações sem o que não seria possível produzir o cuidado, mas, ao mesmo tempo, é possível reconhecer importantes elementos de dissenso e de disputa, quase sempre “silenciadas” no instituído hospitalar. A implantação da classificação de risco “provoca” esse campo como que abrindo fendas na micropolítica do serviço, fazendo brotar elementos interrogadores sobre o modo de produção do cuidado, em particular, o modo como se estabelecem as relações entre os profissionais no tumultuado território dos serviços de urgência. Seria possível dizer que o STM, mais do que um dispositivo técnico-gerencial para classificar o risco, ordenar fluxos e qualificar o cuidado, constitui-se em tecnologia política por interferir intensamente nas relações de poder presentes no serviço de emergência. Se bem sucedido, tanto impacta o campo das relações de poder como pode vir a se constituir em indutor de construção e articulação de redes assistenciais. No entanto, é necessário um processo permanente de negociação.

Palavras Chave

classificação, triagem, serviço hospitalar de emergência, política de saúde.

Area

Gestão de Serviços de Saúde

Autores

ANA AUGUSTA PIRES COUTINHO, LUÍZ CARLOS OLIVEIRA CECÍLIO