Datos del trabajo


Título

ITINERARIOS TERAPEUTICOS COMO ABORDAGEM PARA CONHECER A ASSISTENCIA A SAUDE DE MULHERES QUE VIVENCIARAM A PERDA FETAL

Introdução

O tema dos itinerários terapêuticos vem sendo empregado há quase 20 anos e cresce de forma expressiva como constructo teórico-metodológico em pesquisas da saúde que versam sobre doenças, sofrimentos, aflições e perturbações de pessoas e famílias que vivenciam situações de adoecimento. Tal dispositivo também auxilia na ideia que se constrói, no âmbito da saúde, sobre redes de apoio; acesso, atenção e acolhimento dos serviços; práticas curativas leigas e dos profissionais; qualidade das relações sociais e potenciais cuidativos; adesão a tratamentos e escolhas terapêuticas. Esta abordagem torna visível a diversidade de conhecimentos, saberes, práticas e demandas por cuidado na área da saúde, dando voz aos usuários. Nesse contexto, considerando que mulheres que vivenciaram a perda fetal representam parcela da população feminina em provável situação de sofrimento, aflição, perturbação e adoecimento, é interessante destacar suas trajetórias – desde o momento de diagnóstico da perda até o retorno para seu domicílio com os ventres e braços vazios. Acrescenta-se ao exposto: a) que existem lacunas relacionadas à produção científica brasileira sobre itinerários terapêuticos de mulheres que vivenciaram a perda fetal; b) que fragilidades têm sido apontadas em relação à assistência prestada a mulheres em situação de perda fetal e, geralmente, estão relacionadas ao atendimento dos profissionais e estrutura dos serviços de saúde; c) que se trata de parcela da população, muitas vezes, negligenciada no período pós-parto, principalmente pela Atenção Primária à Saúde; d) que a atenção voltada especificamente para mulheres em situação de perda fetal ainda não tem sido uma prioridade em programas e políticas públicas de saúde brasileira, com protocolos e plano de cuidados específicos que permitam uma assistência integral e qualificada. Diante dessa perspectiva, acredita-se que utilizar a abordagem dos itinerários terapêuticos aplicado a esse contexto representa solo fecundo no que tange ao conhecimento da assistência à saúde prestada a estas mulheres, na perspectiva das próprias.

Objetivos

Constitui-se em objetivo deste trabalho apresentar os itinerários terapêuticos como abordagem para conhecer a assistência à saúde de mulheres que vivenciaram a perda fetal.

Desenvolvimento

Utilizando-se de técnicas como aproximação das participantes do estudo, acompanhamento destas por longo tempo, entrevistas em diversas ocasiões, observações cotidianas, anotações em diário de campo, experiências vivenciadas, insucessos, insights, os itinerários terapêuticos vão sendo construídos. Com diferentes enfoques, este tipo de abordagem pode contribuir para a gestão, organização e utilização dos serviços de saúde, bem como para a construção de práticas assistenciais compreensivas e integralmente contextualizadas. Ainda, constituída por movimentos de indivíduos e/ou grupos que buscam a manutenção ou recuperação da saúde, desvela diversos acontecimentos e tomadas de decisões que formam trajetórias diversas nos cenários de acompanhamento e observação. Nesse contexto, é importante considerar que saúde, adoecimento, vida e morte se relacionam constantemente, porém, a morte é condição nem sempre aceita e capaz de gerar tensões à espécie humana. Quando se trata da morte de um bebê ainda no útero materno muitos interpretam tal evento como uma inversão da lógica de que as pessoas nascem, envelhecem e morrem, principalmente em tempos de fervorosa evolução tecnológica. Para os envolvidos em um processo de perda fetal, principalmente para as mulheres que gestavam este ser, a ruptura da “ordem natural” da vida costuma ser geradora de profundos efeitos e, nesse sentido, a não valorização de todo o contexto pode acarretar em prejuízos importantes para as pessoas enlutadas. Parte-se do pressuposto de que se as mulheres que vivenciaram a perda fetal receberem assistência adequada nesse momento de inversão da existência humana, o processo de elaboração do luto, bem como o enfrentamento desta situação poderá ser facilitado. Esta assistência, principalmente se direcionada por meio de um cuidado qualificado no âmbito físico, emocional, social e cultural, poderá repercutir de forma positiva na trajetória vivenciada pela mulher. Nesse ínterim, a utilização dos itinerários terapêuticos é oportuna e visa auxiliar na compreensão do papel que os encontros entre as pessoas representam, sendo indicado que tais momentos extrapolem as dimensões biológica e técnica do cuidado, atingindo a dimensão relacional e, consequentemente, simbólica. Considerar e tratar a perda gestacional pela sua intensidade e significado poderá auxiliar as mulheres a buscarem forças que as permitam reverter esse momento de dano em potência de vida, independentemente do caminho trilhado por cada uma. Ainda, por meio do conhecimento sobre os itinerários destas mulheres é possível compreender não só seus comportamentos mediante a assistência à saúde, mas a qualidade desta, os serviços utilizados, os profissionais acessados, os desafios enfrentados, os tratamentos e resultados terapêuticos alcançados, as redes de apoio formadas.

Considerações Finais

A gestação, por si só e quando em situação de normalidade, é permeada por momentos simbólicos, podendo ser responsável por causar inúmeras sensações, sentimentos e desafios à mulher que a vivencia. Quando resultante de um desfecho negativo, o simbolismo envolvido pelo processo de perda fetal pode auxiliar a compreender as experiências das mulheres na maneira como significam o cuidado e produzem as redes de sustentação e trajetórias na busca pela assistência à saúde. Nesse contexto, olhar para as mulheres que vivenciaram a perda fetal como pessoas que apresentam necessidades e potencialidades de enfrentamento dos problemas é ponto fundamental para que algumas dimensões da cultura sejam acessadas. Pessoas e processos andam de mãos dadas e são indissociáveis. Assim, a utilização dos itinerários terapêuticos possibilitará evidenciar o cuidado de mulheres que vivenciaram a perda fetal, por meio do conhecimento sobre a assistência à saúde recebida por elas, nos seus diferentes modelos e sistemas. Ainda, revelará como as práticas em saúde são construídas nesta situação de perda, além de se configurar em ferramenta de análise da atenção em saúde e da integralidade das ações. Assim, considera-se que os itinerários terapêuticos constituem abordagem que propicia conhecer a assistência à saúde de mulheres que vivenciaram a perda fetal, configurando-se em importante meio para a qualificação do cuidado prestado a esta parcela da população feminina.

Palavras Chave

Etnografia
Obstetrícia
Morte fetal

Area

Saúde da Mulher

Instituciones

Universidade Comunitária da Região de Chapecó (UNOCHAPECÓ) - Santa Catarina - Brasil, Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) - São Paulo - Brasil

Autores

Joice Moreira Schmalfuss, Iasmim Cristina Zilio, Lucimare Ferraz, Regina Yoshie Matsue