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Título

A VIVÊNCIA FAMILIAR DE CUIDADO NO ADOECIMENTO E MORTE DE MULHER JOVEM POR CÂNCER DE MAMA

Introdução

O adoecimento por câncer é, ainda, carregado de estigmas e, via de regra, é associado à possibilidade concreta de morte. O câncer de mama acarreta profundos e significativos afetamentos à vida da mulher, em decorrência das dores e mutilações que podem dele resultar1. Nesse cenário de sofrimento é necessário pensar em um cuidado apoiador que consiga sustentar aquilo que as pessoas e famílias vivenciam no cotidiano desse adoecimento crônico, no qual os potenciais que dispõem para apaziguar as dores, físicas e emocionais, vão se esvaindo gradual e progressivamente.

Objetivos

Objetivamos compreender a vivência familiar de cuidado no adoecimento e morte por câncer de mama em mulher jovem.

Método

Trata-se de uma abordagem compreensiva, que emprega a História de Vida como estratégia, operacionalizada pela Entrevista em Profundidade2 para a qual foram realizados nove encontros. Os participantes deste estudo foram Beth, mulher jovem diagnosticada com câncer de mama aos 28 anos e que morreu aos 35; suas duas filhas adolescentes, Beatriz e Bruna; e sua mãe, Dona Carlota. As entrevistas foram transcritas e, com a observação de campo, compuseram os dados empíricos. Desse corpus, foram elencadas unidades de significados que, em processo contínuo de depuração, levou-nos aos eixos de sentido, sendo que este estudo é fruto de um deles: “O contexto familiar de cuidado no adoecer e morrer por câncer de mama”. A pesquisa matricial a qual o estudo se vincula foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa sob nº 671/CEP-HUJM/09.

Resultados

Os resultados mostraram que Beth e sua família foram afetadas pelo adoecimento, de modo significativo e particular, levando-as a rearranjos intensos na organização familiar e em suas vidas. Percebemos que a ideia da morte esteve presente desde o momento do diagnóstico e perdurou até o fim da vida de Beth, embora procurasse manter certo distanciamento da doença, evitando, inclusive, nomeá-la ‘câncer’. A demanda por tratamento complexo, continuado e de longa duração, afetou a situação socioeconômica familiar, pois Beth, até então provedora da família, passa a ter dificuldades para trabalhar; suas filhas tiveram, então, que assumir integralmente o sustento financeiro da casa. Além disso, também faziam revezamento, por meio de “plantões”, para o cuidado diuturno à mãe. Os detalhes quanto ao modo de produzir o cuidado, expressos nas narrativas das adolescentes, revelam uma maturidade precocemente alcançada à força do sofrimento e da sobrecarga de atividades de grande responsabilidade. Importante salientar que Beth dispunha de um núcleo familiar numericamente pequeno, pois, além das duas filhas adolescentes, restavam sua mãe e o marido, sendo que este último se mostrava pouco cuidador, acarretando maior sobrecarga para suas filhas e a mãe. No curso do adoecimento Beth divorciou-se do marido, conformando-se nova dinâmica familiar, porém, preservando a centralidade do cuidado nas filhas, visto que a relação com a mãe, apesar de próxima e intensa, era conflituosa. Após cinco anos de tratamento, Beth ouviu do médico, que a acompanhava desde seu diagnóstico, que não havia mais o que ser feito, pois o câncer havia se espalhado e estava fora de possibilidade de cura. Esse evento marcou profundamente sua vida, e a desesperança que esse profissional lhe transmitiu a fez buscar outro que, ao menos, pudesse deixá-la entrever algo que pudesse ser feito. O tratamento, ainda que doloroso e desgastante, tinha para Beth o sentido de esperança ‘de vida’, mesmo que não se desse ‘a cura’, como bem aponta ao afirmar que “enquanto há vida há esperança”. No entanto, a lógica profissional pareceu se dar no sentido de que, havendo possibilidade de cura havia esperança e, portanto, dever-se-ia investir no tratamento. E, quando a cura já não se faz mais possível, a tendência é de se afastar do campo de batalha contra a doença, abandonando, também, o doente e o cuidado à vida que ele requer até seu último instante. A exacerbação das manifestações da doença ampliou também a exigência de cuidado, tornando-se dependência quase total dele. A família cuidou ao longo do tempo e de diferentes modos, empregando os recursos que lhe estavam disponíveis, incluindo a massagem e a oração. Os serviços/profissionais de saúde passaram a ser acionados pontualmente, em especial quando havia necessidade de intervenção medicamentosa. Com o agravamento do quadro respiratório pela metástase, necessitando de oxigeno terapia, Beth foi hospitalizada. E, pela relação de vínculo construída ao longo do trabalho de campo para recolha de sua história de vida, ela solicitou nossa presença. Com as mãos entrelaças às nossas, apertadas fortemente, com os olhos esbugalhados e respiração ofegante Beth nos fez a pergunta que, certamente, é evitada por todos os profissionais de saúde: “O que está acontecendo comigo?” Foi preciso calma, voz tranquila, para um diálogo intenso em que poucas palavras foram ditas; e apenas lhe explicamos que a doença estava muito avançada e a cura não era mais possível. O que mais importava ali era a presença, a atenção e a preocupação com todo o pouco tempo que ela dispunha. Durante essa conversa-silêncio de três horas, Beth dormiu calmamente, ainda segurando nossas mãos, melhorando sua respiração. Naquela noite se despediu das filhas, da mãe e ainda organizou a guarda legal de Beatriz e Bruna. Morreu na manhã seguinte. Tratou-se, nesta situação, de termos assumido uma atitude de cuidado3, de um estar junto, por inteiro, cuidando em todas as dimensões, da vida, na vida e para a vida.

Considerações Finais

Nessa experiência por nós vivida junto à Beth e sua família, compreendemos que não se cuida para não morrer, se cuida para viver; e, embora tal posição pareça mera questão de semântica, é essencial para quem que vivencia o seu morrer, pois lhe permite viver o tempo que há para viver. E, ancoradas no modo familiar de cuidado, entendemos que há que se cuidar até o fim, assegurando conforto e minimizando sofrimento, possibilitando que a pessoa viva seus últimos momentos plenamente e como deseja viver.

Palavras Chave

Referências:

1- Timm MS, Perlini NMOG, Beuter M, Prates LA, Birk NM, Piccin C. A imagem corporal na ótica de mulheres após a mastectomia. Cienc Cuid Saude. 2017;16(1).

2- Araújo LFS, Dolina JV, Petean E. Musquim CA, Bellato R, Lucietto GC. Diário de pesquisa e suas potencialidades em pesquisa qualitativa. Rev Bras Pesq Saúde. 2013 Jul-Set;15(3):53-61.

3- Dolina JV, Bellato R, Araújo LFS. Research experience whith a person going through the process of dying and death. Journal of Palliative Medicine. 2014; 17(2):244-5.



Palavras-chave: Relações familiares. Morte. Câncer de mama. Cuidados à saúde.

Area

Doenças crônicas/condições crônicas

Instituciones

Universidade Federal de Mato Grosso - Mato Grosso - Brasil

Autores

Janderléia Valéria Dolina, Roseney Bellato, Laura Filomena Santos De Araújo, Juliana Soares Androlage