Datos del trabajo


Título

Questões éticas no atendimento à saúde de pessoas LGBT

Introdução

Estudos apontam que introjetos socioculturais fundamentados na LGBTfobia e na heteronormatividade permeiam os atendimentos em saúde, o que resulta em assistência de pouca qualidade e insuficiente, prejudicando o acesso das pessoas LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais) à saúde (1-4). Nesse sentido, vivências de preconceito e discriminação, além das inúmeras iniquidades em saúde, contribuem para que as pessoas LGBT se encontrem em uma importante situação de vulneração, sustentada pelas normas morais vigentes nas sociedades contemporâneas. Significa dizer que, para além da vulnerabilidade a qual todas as pessoas estão submetidas, vivenciam ou encontram-se submetidos a condições concretas de carências ou danos pela falta de suporte, principalmente por parte do Estado, havendo insuficientes condições para o exercício da autonomia e da cidadania (5). A Bioética Cotidiana, proposta por Giovanni Berlinguer, constitui um importante referencial reflexivo que aponta caminhos e ajuda a analisar criticamente os problemas éticos que permeiam questões de vida e saúde, podendo-se incluir em sua pauta as situações atreladas às questões de gênero, discriminação e exclusão social. Assim, sob o olhar da Bioética Cotidiana a problemática da atenção à saúde da população LGBT se configura como uma questão de ordem ética (6).

Objetivos

A partir desse contexto de vulneração, discriminação e exclusão social, objetivou-se analisar as questões éticas implicadas na assistência à saúde das pessoas LGBT no âmbito da Atenção Básica à Saúde (ABS), levando-se em consideração que a discussão e o conhecimento desta realidade podem contribuir no debate para políticas públicas promotoras de inclusão e reconhecimento, principalmente na área da Saúde e da Educação.

Método

Após aprovação do projeto de pesquisa pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal de Santa Catarina (CAAE: 57917516.0.0000.0121), esta pesquisa de abordagem qualitativa foi realizada a partir de entrevistas semiestruturadas com 15 trabalhadores(as) de duas Unidades Básicas de Saúde (dois agentes comunitários de saúde, cinco auxiliares ou técnicos de administração, enfermagem ou saúde bucal , três cirurgiões-dentistas, três enfermeiros e dois médicos) da Secretaria Municipal de Florianópolis, SC. Os dados foram analisados utilizando-se a técnica de Análise Temática de Conteúdo com auxílio do software Atlas.ti®7.5.16, e interpretados a partir da Teoria do Reconhecimento de Nancy Fraser e da Bioética Cotidiana. Após leitura flutuante das entrevistas transcritas, iniciou-se a codificação, originando 74 códigos que foram agrupados em 4 categorias, uma delas intitulada “Problemas éticos”, cujos resultados são apresentados neste trabalho.

Resultados

Os problemas éticos no atendimento à saúde das pessoas que não correspondem à cis-heteronorma ocorrem principalmente na relação entre trabalhadores e usuários de saúde. Consideraram-se como problemas éticos as questões relatadas pelos(as) trabalhadores que de alguma forma se encontravam relacionadas às pessoas LGBT, prejudicando sua saúde, expectativa de vida, ferindo sua humanidade, dignidade, qualidade de vida, e/ou seus direitos sociais. Em outas palavras, os problemas éticos foram caracterizados por afetarem direta ou indiretamente a atenção à saúde das pessoas LGBT. Os resultados revelaram, então, diversos problemas, tais como o não reconhecimento, situações de constrangimento, intolerância e negligência, invisibilização do preconceito e silenciamento das questões de gênero e sexualidade, negação da identidade das pessoas trans e travestis, e desrespeito à sua dignidade, bem como falta de reflexão ética e autocrítica por parte dos trabalhadores da ABS. Os problemas éticos encontrados reforçam o sofrimento e as injustiças cotidianamente acumuladas e, ao mesmo tempo, convocam o Estado ao imperativo ético de proteção aos mais vulnerados, explicitada em políticas públicas, tanto na Saúde quanto na Educação. Sociedades marcadas pela heteronormatividade julgam como imorais qualquer outra orientação sexual, contribuindo, dessa forma, para uma abstenção de responsabilidade do trabalhador de saúde, questão que sustenta a invisibilidade do preconceito com posturas calcadas na cis-heteronormatividade e no machismo. A responsabilidade social na oferta de serviços públicos e frente à produção de saúde em relação às pessoas LGBT pode ser pensada como na Teoria do Reconhecimento de Nancy Fraser, buscando-se vencer as iniquidades e injustiças sofridas diariamente. Tornar consciente os valores e desvalores compartilhados na atenção à saúde das pessoas LGBT é um ponto crucial na formação profissional em saúde e para a educação permanente dos trabalhadores da ABS.

Considerações Finais

Compreendeu-se que a atenção à saúde das pessoas LGBT é dificultada pela presença de diversos entraves, os quais contribuem para a permanência do estado de vulneração vivenciado pelas pessoas LGBT. Faz-se necessário então, a inclusão nas discussões em saúde as questões de gênero e de sexualidade como construções sociais complexas, ampliando o olhar para além de uma visão binária de gênero. É importante ressaltar também a responsabilidade do Estado brasileiro – que é laico – com o comprometimento desta perspectiva de mudança moral, viabilizando políticas públicas que promovam o reconhecimento e a inclusão social, assim como de medidas protetivas ao longo do processo. A bioética pode ser um importante instrumento neste caminho, desde que fundamentada em uma concepção laica e crítica em direção ao pluralismo moral.
Referências:
1) Mello L, Perilo M, Braz CA, Pedrosa C. Políticas de saúde para lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais no Brasil: em busca de universalidade, integralidade e equidade. Sexualidad, Salud y Sociedad (Rio de Janeiro) dec. 2011; (9):7-28.
2) Sousa BC et al. Famílias homoafetivas na estratégia de saúde da Família: uma reflexão bioética. Revista de Atenção à Saúde (antiga Rev. Bras. Ciên. Saúde) 2014; 12(39):66-73.
3) Santos AR et al. Implicações bioéticas no atendimento de saúde ao público LGBTT. Revista Bioética 2015; 23(2):400-408.
4) Garcia CL, Albuquerque GA, Drezett J, Adami, F. Saúde de Minorias Sexuais do Nordeste Brasileiro: Representações, Comportamentos e Obstáculos. Journal of Human Growth and Development 2016; 26(1):95-100.
5) Schramm FR. Bioética da proteção: ferramenta válida para enfrentar problemas morais na era da globalização. Revista Bioética 2008; 16(1):11-23.
6) Silva ALR, Hellmann F, Finkler M, Verdi M. A Bioética Cotidiana como instrumento de reflexão sobre a atenção à saúde da população LGBT. Revista Brasileira de Bioética 2017; 13(e3):1-10.

Palavras Chave

Atenção Primária à Saúde; Bioética; Minorias Sexuais e de Gênero; Pessoas LGBT; Preconceito.

Area

Gênero, Sexualidade e Saúde

Autores

Ana Luísa Remor da Silva, Mirelle Finkler, Leandro Ribeiro Molina, Rodrigo Otávio Moretti-Pires