Datos del trabajo


Título

TRANSNACIONALIDADE TERAPEUTICA ANTROPOSOFICA BRASIL/SUIÇA: CONTORNOS E FLUXOS.

Introdução

No período de setenta anos, a medicina antroposófica no Brasil acolheu as diretrizes da Matriz da Antroposofia na Suíça, localizada na cidade de Dornach, na Suíça, reproduzindo na Clínica Tobias, localizada em São Paulo, a medicina e as principais terapias. A etnografia1 realizada entre os anos de 2012 e 2016, no Brasil e na Suíça, revelou uma transnacionalidade terapêutica instigante. A Antroposofia brasileira, que a priori absorvia as práticas terapêuticas adaptando-as as questões culturais e climáticas, também passou a produzir e exportar terapias antroposóficas nacionais, para a Europa. Utilizamos o termo “transnacionalidade” terapêutica, um conceito caro a Antropologia da Religião, por compreender o seu potencial para explicar o duplo movimento de desterritorialização que questiona a fidelidade a um local ou uma nacionalidade e, simultaneamente, leva a uma homogeneização cosmopolita das culturas híbridas. A Antroposofia é uma ciência espiritual edificada na Suíça, no início do século XX. Rudolf Steiner, filósofo e esotérico, após sua passagem pela Teosofia da Madame Blavatsky, organizou a Antroposofia como uma ciência fundamentada em uma empiria espiritual oriunda da ampliação do método fenomenológico da observação da natureza, elaborado por Goethe, no Romantismo Alemão. Os resultados desta ciência espiritual são aplicados a diversas áreas do conhecimento como a agricultura biodinâmica, a educação Waldorf e a medicina ampliada pela Antroposofia.

Objetivos

O objetivo da etnografia era descrever a concepção de cura na medicina antroposófica neorromântica. Para este paper objetivamos descrever, especificamente, a transnacionalidade das terapias antroposóficas Brasil/Suíça e, delinear os contornos dos fluxos transnacionais.

Método

Esta pesquisa demandou uma metodologia qualitativa realizada por meio de uma etnografia multilocalizada, adotando procedimentos de observação participante, entrevistas em profundidade e acompanhamento da vida cotidiana dos interlocutores. A opção pela investigação etnográfica deve-se, em parte, por sua relevância e atualidade nas pesquisas em saúde. O antropólogo Clifford Geertz2 argumentou que a etnografia não é definida pelas técnicas que emprega, como observação participante e entrevistas, mas por um tipo particular de esforço intelectual que ele descreve como uma “descrição densa”. Esta descrição, tipicamente obtida por meio da imersão na vida diária do grupo pesquisado, focaliza-se nos detalhes e informações subjacentes, almejando explicar modos de interação e descrever padrões de significado que informam suas ações.

Resultados

As terapias antroposóficas se dividem em terapias destinadas ao corpo, a alma e ao espírito. São três as terapias que apresentam transnacionalidade: o Método Padovan, o Panorama Biográfico e a Terapia Artística. As duas primeiras terapias foram elaboradas no Brasil seguindo o fluxo da periferia para o centro, ou seja, do Brasil para a Europa. A última faz o percurso convencional, do centro para a periferia, e apresenta aspectos relevantes sobre as formas de adaptação destas terapias em culturas distintas das europeias. A Terapia do Método Padovan apesar de ser amplamente reconhecida, dentro e fora do Brasil, parece ter ganho notoriedade internacional somente após sua passagem pela Antroposofia na Europa, como se a terapia elaborada fora das fronteiras culturais só pudesse ser legitimada ideologicamente em um fluxo internacional. Existe a hipótese de que a notoriedade internacional da terapia tenha enfraquecido as raízes de origem e os europeus não a reconhecem como oriunda do Brasil. No Brasil, o mercado da cura ocupou-se por dissimular os aspectos espirituais da Antroposofia, ocultando seu percurso nas publicações científicas. A segunda terapia, o Panorama Biográfico, é realizado por um leque de profissionais do campo da humanas e biológicas, originando equipes multidisciplinares que obrigatoriamente realizam uma formação antroposófica para exercer a terapêutica. A formação terapêutica oferecida pela Clínica Tobias é a referência considerada mais próxima das orientações do Goetheanum, em comparação com a demais. A certificação destes terapeutas e emancipada das diretrizes do Goetheanum, mas mantem o que considera “uma relação de respeito” em relação as diretrizes da Sede Oficial em Dornach. Por último, a Terapia Artística, que em sua vez, apresenta um fluxo de adaptação, competição e hierarquização entre os atores terapeutas de acordo com o país de origem da formação. Os terapeutas formados na Europa são considerados mais completos e melhores se comparados aos terapeutas formados no Brasil. Sobre a adaptação terapêutica, os profissionais se esforçam sobremaneira em aclimatar as orientações das doutrinas das cores de Goethe para a diversidade climática brasileira.

Considerações Finais

Um olhar superficial sobre a Antroposofia no Brasil sugeria, erroneamente, no início do trabalho de campo, um fluxo decolonial maior que realmente se erigia. Entretanto, a transnacionalidade terapêutica na Antroposofia no sentido Brasil-Suíça, não consegue assegurar, em concomitância, um fluxo decolonial, ou seja, não se depreende da lógica da colonialidade e de seus efeitos; não se desapega do aparato que confere prestígio e sentido a Europa. Está explicita uma hierarquização de gênero e etnia na cena da aceitação e divulgação do Método Padovan na Europa, quando um homem europeu conduz a terapia e a legitima, ao mesmo tempo que aniquila sua origem. O mesmo ocorre na internalização da subalternidade nas estruturas subjetivas do colonizado na formulação da terapia do Panorama Biográfico por uma brasileira considerada relevante principalmente porque possui origem europeia. A Terapia Artística segue a tendência de outras teorias vindas da Europa, assim com as ideias liberais. A Terapia Artística comunga do desconforto das “ideias fora do lugar”3.
Referências
Bastos RL. Corpo e Saúde na Antroposofia: bildung como cura [tese]. São Paulo: Faculdade de Medicina da Universidade Federal de São Paulo, 2016.
Geertz C. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: Zahar; 2008.
Schwarz, R. (org.). "As ideias fora do lugar". In: Ao vencedor as batatas. São Paulo: Duas Cidades,1999. Sequências brasileiras.

Palavras Chave

Transnacionalidade Terapêutica
Etnografia
Medicina Antroposófica
Saúde Coletiva
Decolonial

Area

Cultura e saúde

Autores

Raquel Litterio Bastos, Pedro Paulo Gomes Pereira