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Título

PERSPECTIVA DO USUARIO: POR UMA GENEALOGIA DO TERMO SOB A OTICA DA INTEGRALIDADE

Introdução

Quase trinta anos depois da criação do SUS, apesar do avanço democrático que pôde ser notado com o surgimento de espaços de luta (institucionalizados e não institucionalizados), ainda não se percebe a efetivação do direito a falar e ser ouvido do usuário de saúde, que permanece à margem das decisões. Da mesma forma, diversos estudos, apesar de apontarem para a centralidade do usuário, permanecem enxergando esse o usuário como agente passivo do sistema, (MARTINS E PINHEIRO, 2011). Consideram, na maior parte das vezes, que esse usuário é determinado e ignoram a influência das suas relações sociais na forma como as ações em saúde são estabelecidas e como os próprios determinantes sociais são constituídos.

Objetivos

Dentro desse contexto, esse texto se propôs a discutir como os estudos em saúde voltados para a centralidade do usuário vem ressignificando esse usuário e a pensar, a partir daí, a importância da perspectiva do usuário na oferta dos serviços em saúde.

Desenvolvimento

Silva Junior et al. (2016) destaca que a dimensão perspectiva do usuário ainda não possui definição formal. Alguns sociólogos que atuam no campo da saúde apontam para a importância do usuário ao discutirem qualidade de serviços públicos. Serapioni (1999) ocupou-se de discutir aspectos que, segundo ele, seriam fundamentais para superar uma polarização existente entre a perspectiva dos usuários e dos profissionais de saúde que dificultaria o atingimento dessa suposta qualidade. O autor resgata obras pioneiras para se pensar o usuário. Uma delas, “A representação do eu na vida cotidiana” de Erving Goffman, introduz a categoria de ‘não-pessoa’ como sendo aqueles sujeitos que, apesar de serem tratados em sua presença, sofrem um processo de despersonalização que faz com que eles sejam olhados, mas não vistos, ou seja, tratados como se ali não estivessem (GOFFMAN, 1969 apud SERAPIONI, 1999). Nesse trabalho, Goffman defende a ideia de que o homem em sociedade sempre utiliza formas de representação, ainda que de maneira inconsciente, para se mostrar ao outro. Em 1956, o autor já apontava para a importância das relações sociais na construção desse sujeito: “(...) o papel que um indivíduo desempenha é talhado de acordo com os outros papéis desempenhados pelos outros presentes (...)” (GOFFMAN, 1985, p.9). Isto é, ocorrem interações na vida real, tal qual ocorrem no palco, que irão alterar o rumo das ações, sendo, portanto, fundamental que essas relações sejam consideradas. Esse ponto, de certa forma, é atualmente defendido dentro da ideia de Redes Sociais. Ainda na década de sessenta, outros sociólogos, também resgatados por Serapioni (1999), já denunciavam o fato de que os serviços públicos estavam, muitas vezes, voltados para sua própria organização, sendo, na prática, insensíveis aos usuários (ETZIONI, 1967; BLAU 1965 apud SERAPIONI, 1999). Apesar dessas discussões no campo das ciências sociais já apontarem, a partir de abordagens distintas, a importância de se olhar para o usuário, tal qual para as relações que este usuário estabelece com o outro e com o mundo, estudos indicam que o marco dessa discussão, na saúde, é a década de 1980, quando Donabedian consolida os seus estudos sobre qualidade no âmbito dos serviços de saúde. Donabedian (1990) defende que a avaliação da qualidade em saúde deve considerar os três componentes que o cuidado em saúde envolve: atenção técnica, relacionamento interpessoal e o ambiente em que esse cuidado é prestado, considerando ainda características como cultura e disponibilidade de recursos. Para ele, essas características alteram as preferências e crenças pessoais, o que faz com que a percepção de qualidade seja alterada e, com isso traz a necessidade de se modificar a forma como esta é analisada (DONABEDIAN, 1990). Sarapioni menciona em seu trabalho que o aumento no interesse do estudo da qualidade sob a perspectiva do usuário teria aumentado, principalmente, como consequência de uma necessidade dos governos de otimizarem a utilização de recursos financeiros, reduzindo despesas a fim de se superar uma crise fiscal do Estado e, ainda, diminuir reclamações judiciais custosas provenientes da prestação de um “mau serviço” (SERAPIONI, 1999). A literatura internacional, nesse mesmo sentido, parece, de fato, colocar sobre o termo usuário uma carga econômica ao utilizar palavras como client, costumer e consumer, típicas do setor privado. Por isso, muitas vezes, considera-se, equivocadamente, que o papel do usuário dentro dos serviços de saúde é similar ao que ele exerce no mercado de outros serviços e de produtos. A adoção do termo usuário tenta assumir que o sujeito que utiliza serviços de saúde é mais do que um ser paciente ou um mero consumidor, incorporando noções de cidadania e direito social (ESPERIDÃO E TRAD, 2006). No Brasil, Esperidão e Trad (2006) destacam que os estudos de satisfação pela perspectiva do usuário se desenvolveram, sobretudo na década de 1990, quando houve um fortalecimento do controle social do SUS que representou uma maior participação da comunidade no planejamento e avaliação em saúde. As autoras concentram-se na análise do termo satisfação do usuário, indicando a polissemia conceitual e escassa teorização existente sobre o tema. Dentre os diversos aspectos levantados e discutidos, apontam que uma das funções mencionadas pelos autores para os estudos de satisfação do usuário “é a de oferecer uma avaliação dos serviços prestados na perspectiva dos usuários” (ESPERIDÃO E TRAD, 2006).

Considerações Finais

Apesar de uma série de estudos tratarem do usuário e da importância de modelos assistenciais e avaliativos centrados nele, ainda permanecem lacunas no entendimento do próprio conceito de usuário, assim como este segue associado apenas à ideia de satisfação. Mesmo com as dificuldades teóricas que permeiam esse assunto, a construção desse texto permitiu que se caminhasse em direção à genealogia do termo. Foi possível sinalizar a necessidade de superar visões simplistas funcionais e individualistas e inserir nos estudos, o reconhecimento desse usuário como sujeito ativo, membro de uma rede. Além do reconhecimento desse usuário pelos profissionais de saúde e acadêmicos, é necessário que se permita que esse usuário se enxergue como ator central nas ações em saúde. Segue sendo um desafio pensar novos instrumentos metodológicos que possibilitem, efetivamente, que se pense o usuário a partir do próprio usuário.

Palavras Chave

usuário, paciente, perspectiva do usuário, participação social

Area

Democracia, Participação e Controle Social na Saúde

Instituciones

Instituto de Medicina Social - Uerj - Rio de Janeiro - Brasil

Autores

THAÍS JERONIMO VIDAL, FELIPE DUTRA ASENSI, ROSENI PINHEIRO