Datos del trabajo


Título

TRAJETORIA DE UMA ADOLESCENTE EM SITUAÇAO DE RUA NO MUNICIPIO DE CAMPINAS-SP

Introdução

Segundo estudo do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), atualmente há 24 mil adolescentes em situação de rua no Brasil.
Este é um problema mundial e esta condição, torna-os vulneráveis, expondo-os a vários riscos para problemas de saúde de naturezas orgânica e psíquica, pois estão expostos a todo tipo de violação de seus direitos.
O levantamento do Conanda mostrou que, do total de meninos e meninas vivendo nessas condições, 59,1% dormem na casa de seus familiares e trabalham nas ruas; 23,2% dormem nas ruas; 2,9% dormem temporariamente em instituições de acolhimento e 14,8% circulam entre esses espaços. Segundo os próprios meninos e meninas, a principal razão para estarem nas ruas é a violência doméstica (70%).
O relatório da Unicef sobre adolescentes brasileiros, evidencia que, mais do que excluídos, esses meninos e meninas em situação de rua são banidos, por preconceito e discriminação, mesmo por instituições que deveriam acolhê-los. Em levantamento do Conanda, 12,9% dos entrevistados já haviam sido impedidos de receber atendimento na rede de saúde, 6,5% de emitirem documentos, 36,8% de entrarem em algum estabelecimento comercial, 31,3%, de usarem transporte coletivo, 27,4%, de entrarem em bancos e 20,1% de entrarem em algum órgão público.
No Brasil, em 2009, foi instituída a Política Nacional para a População em Situação de Rua (PSR) e, em 2012, o Consultório na Rua (CnaR), integrante do componente da Atenção Básica da Rede de Atenção Psicossocial, permitiu atuar frente aos diferentes problemas e necessidades de saúde da PSR.
Em Campinas, o CnaR iniciou suas atividades em 2012 e prioriza o acesso ao tratamento de qualidade no local, na perspectiva da integralidade, do trabalho em rede, construindo parcerias com outros dispositivos do município, fomentando um trabalho de abrangência intersetorial.

Objetivos

Apresentar a trajetória de uma adolescente de 20 anos em situação de rua na rede de saúde e intersetorial de Campinas.

Método

Este estudo é parte da pesquisa de Mestrado “Vulnerabilidade em adolescentes e jovens em situação de rua no município de Campinas”. Foram realizadas entrevistas semiestruturadas com os adolescentes atendidos pela equipe do CnaR. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Unicamp.

Resultados

Carolina* (nome fictício) cresceu em abrigos e foi para a rua aos 11 anos; onde iniciou o uso de crack, teve diversas passagens pela polícia, sofreu violência por desconhecidos, pela guarda municipal e, principalmente, pelo companheiro.
Após várias tentativas de acesso pela equipe do CnaR e do SOS Rua (Assistência Social), aos 17 anos, ela aceita cuidado. Vincula-se à equipe do CnaR, permite que sejam colhidos exames e concorda em ir para o Centro de Atenção Psicossocial para Álcool e Drogas (CAPS-AD), sendo diagnosticada com HIV e Tuberculose pulmonar.
Intensificou-se o trabalho em rede para levá-la ao Centro de Referência DST/AIDS e realizar o tratamento supervisionado da Tuberculose e da terapia antirretroviral (TARV).
Carolina desaparece alguns dias, é encontrada pela equipe do SOS-Rua com fratura exposta de rádio, após sofrer agressão pelo companheiro. Não é a primeira, já sofreu três abortos, decorrentes de agressões anteriores.
Equipe do CnaR vai buscá-la e a leva ao Hospital Municipal, de onde ela evade horas depois.
Após dois meses é reencontrada, aceita o leito no CAPS, onde reinicia o tratamento para Tuberculose, a TARV e antibióticos. Na alta não há vagas nas Casas de Passagem para acolhê-la.
De volta às ruas, ela tem recaída no uso do crack e abandona os tratamentos. Equipe do CnaR realiza diversas buscas ativas e, após, algumas semanas reencontra Carolina, ainda mais emagrecida e com marcas de agressão pelo companheiro.
Carolina (com 19 anos) aceita internação no Hospital Américo Brasiliensis para tratamento da tuberculose, reintrodução da TARV e desintoxicação.
O projeto de internação planejado para seis meses, durou dois. Ela não conseguiu manter-se abstinente e evadiu, retornando ao CAPS-AD alguns dias depois solicitando leito porque tinha feito uso intenso de crack. Evadiu após 48 horas no leito.
Hoje Carolina (aos 20 anos) encontra-se em situação de rua, em região de alto consumo de crack. Os Redutores de Danos do CAPS-AD, a equipe do CnaR, a Agente Comunitária de Saúde do Centro de Saúde (CS) de referência do território e o SOS Rua encontram-na semanalmente. Conseguiu terminar o relacionamento abusivo com seu companheiro mas diz não estar pronta para retomar os outros tratamentos. A Vigilância de Campinas está ciente e sabe que não adianta interná-la compulsoriamente. Sabemos que a Tuberculose e o HIV constituem um problema de saúde pública. Por este motivo há uma intensificação do cuidado com três equipes de saúde e a Assistência Social, na tentativa de garantir sua autonomia, evitando, ao mesmo tempo a transmissão destas patologias através da distribuição de insumos para o uso de drogas e de preservativos.
Durante a entrevista, Carolina afirma que só consegue alimentar-se e tomar banho quando vai ao CAPS-AD. Quando perguntamos do que ela tem mais medo morando na rua, responde: “da maldade das pessoas”.

Considerações Finais

Esta trajetória é comum à maioria dos adolescentes em situação de rua. Expostos desde cedo à violência doméstica ou dos abrigos, vão para as ruas para escapar dela, mas, logo percebem que a violência continua presente sob a forma de agressões físicas, verbais, estigmatização, invisibilidade.
Têm seus direitos frequentemente violados, necessitando ser acompanhados pela equipe do CnaR ou do CAPS-AD a outros serviços de saúde (CS, PS, especialistas) para que possam ser atendidos.
No cuidado desses adolescentes, o pacto é no dia-a-dia, sempre na tentativa de respeitar a autonomia, trabalhando na lógica da Redução de Danos e do resgate do Sujeito.
O trabalho em rede de saúde e intersetorial é necessário para buscar a integralidade do cuidado frente a tamanha vulnerabilidade e, é fundamental como rede de proteção contra “a maldade das pessoas” (e da sociedade), maior temor de Carolina.

Palavras Chave

adolescência, rua, vulnerabilidade

Area

Saúde e populações vulneráveis

Instituciones

Faculdade de Ciências Médicas- Universidade Estadual de Campinas - São Paulo - Brasil, Serviço de Saúde dr. Cândido Ferreira (Consultório na Rua Campinas) - São Paulo - Brasil

Autores

Rachel Esteves Soeiro, Alcyone Apolinário Januzzi, Maria de Lurdes Zanolli