Datos del trabajo


Título

HERMENEUTICA DE PROFUNDIDADE E SUAS CONTRIBUIÇOES NA COMPREENSAO DAS CONDIÇOES DE VIDA DE JOVENS DA PERIFERIA

Introdução

A Hermenêutica de Profundidade (HP), proposta por Thompson e baseada em autores como Paul Ricouer e Jurgen Habermas, se constitui como uma abordagem teórica e metodológica que permite estudar e interpretar as formas simbólicas e os sentidos mobilizados pela ideologia. Tanto as formas simbólicas como a ideologia são construídas social, histórica e culturalmente. Interpretar a ideologia é tornar explícita a conexão entre o sentido mobilizado pelas formas simbólicas e as relações assimétricas de poder que este sentido ajuda a estabelecer e sustentar. Há interesse em se investigar a estrutura e a organização tanto externa quanto interna a tais processos. Na proposta da HP o campo da pesquisa não é apenas um objeto, mas um campo-sujeito, ou seja, os indivíduos que participam do estudo mobilizam sentidos, refletem, agem: o campo de estudo, dinâmico, pulsa vida e se transforma constantemente. O pesquisador ao se inserir no campo-sujeito passa a integrar as relações existentes em determinado contexto histórico e social e a interferir no próprio campo. A HP possui três patamares de análise que estão inter-relacionados, conforme veremos nas seções seguintes.

Objetivos

Este resumo se refere a resultados de uma pesquisa de doutorado financiada pela FAPESP (processo nº 2015/26500). A pesquisa é realizada em uma comunidade da periferia de Cubatão/SP chamada Vila dos Pescadores (VP). Tem-se como objetivo discutir as contribuições da hermenêutica de profundidade no estudo das condições de vida e de saúde de jovens moradores dessa comunidade.

Método

Os três patamares da HP são: análise sócio histórica, análise formal e interpretação/reinterpretação. A análise sócio histórica consiste na compreensão do contexto no qual se insere o objeto de estudo. Para a construção dos resultados nessa fase foram feitas observações participantes e entrevistas com trabalhadores da saúde e da ONG e jovens inseridos em diferentes grupos. A Unidade de Saúde foi a primeira instituição com a qual foi feito o vínculo e a partir dela foram feitos vínculos e observações em outros locais como uma ONG existente no bairro e um grupo de hip hop. Ao longo dos trabalhos de pesquisa e extensão da UNIFESP na comunidade, desde 2012, temos privilegiado os relatos dos indivíduos sobre suas vivências atuais e pregressas na VP. A Análise Formal propõe a compreensão do discurso dos indivíduos e suas formas simbólicas e ideológicas, apreendendo seus sentidos e significados. Para cada observação foi produzido um diário de campo. As entrevistas semiestruturadas foram gravadas e transcritas na íntegra. Para a análise formal optou-se pela Epistemologia Qualitativa proposta por González-Rey, analisando-se os sentidos construídos histórica e socialmente pelos indivíduos em sua relação dialética com o contexto. No último patamar, a Interpretação/Reinterpretação, foram produzidas novas interpretações de modo crítico e embasado na teoria. Recebe o nome de reinterpretação, pois se entende que os indivíduos já possuem interpretações acerca de sua realidade.

Resultados

Durante o percurso da universidade na comunidade desde 2012, através de pesquisas e extensão, os jovens aparecem nos discursos como um grande problema na comunidade dado o seu envolvimento com o tráfico de drogas. Uma ONG e o grupo de hip hop para jovens, iniciativas da própria comunidade, aparecem como formas estratégicas de luta contra o envolvimento de jovens no tráfico e como opções culturais em meio a tantas ausências. O estigma de morar em uma comunidade violenta e construída sobre o mangue é um empecilho para conquistar um emprego. A culpa por recai sobre o jovem, visto como inconsequente por ter abandonado os estudos ou se envolvido no tráfico de drogas para obter algum ganho financeiro. O Estado se faz presente na comunidade através de três instituições: unidade de saúde, creche e polícia (vista pela comunidade como aquela que leva a violência). Percebe-se nos discursos a ideia de juventude como risco, na medida em que estes sujeitos apresentam, comportamentos inadequados: sexo desprotegido, envolvimento no tráfico, uso de drogas. A ideia de tutela e controle sobre os jovens aparece no imaginário das pessoas, como quando dizem que é “preciso tirar o jovem da rua”. O grupo de hip hop, por exemplo, é descaracterizado e deslegitimado por ser totalmente desenvolvido por jovens mesmo que este “tire” os jovens da rua. Rua pode ser entendida como espaço público e reflete como o Estado é ausente na vida dessa população. Rua remete também a uma concepção ideológica que não consegue conceber outro caminho para os jovens que não seja o do enquadramento em alguma instituição que possa lhe disciplinar e incutir os valores da sociedade capitalista. O jovem na rua é assim enquadrado pela polícia que não lhe reconhece como gente e cidadão. Na contramão da vulnerabilidade e naturalização dos diversos tipos de violência praticados contra os jovens, grupos como a ONG e o hip hop lutam pela construção da cidadania em um nível de reconhecimento intersubjetivo e se constituem como espaços estratégicos para a construção de vínculos comunitários.

Considerações Finais

Ao mesmo tempo em que muitos discursos sobre a juventude valorizem-na como aquela que é nosso futuro e nossa possibilidade de transformação, estes mesmos discursos mantém os jovens em posição de controle, tutela e em um estágio de pré-cidadania. A HP valoriza o discurso dos sujeitos, por entender que estes possuem capacidade de compreender os processos simbólicos e produzir suas próprias interpretações. A pesquisa que utiliza este referencial pode valorizar as experiências dos jovens, pois não é somente o cientista social que interpreta. Além disso, a HP guarda potenciais para equilibras análises que levam em conta aspectos subjetivos e objetivos, um não atuando em detrimento do outro mas em complementaridade. Estudar as condições de vida e de saúde pelo olhar dos próprios jovens pode incrementar a produção de um conhecimento mais próximo da realidade vivida por estes indivíduos, desnaturalizando relações de poder que mantém assimetrias e desigualdades.

Palavras Chave

Area

Promoção da saúde

Autores

DANILO DE MIRANDA ANHAS, Carlos Roberto Castro-Silva