Dados do Trabalho
Título
ABSENTEISMO NO ANO DE 2020 DURANTE A PANDEMIA POR COVID-19 EM UM SERVIÇO DE TRAUMATOLOGIA DE UM HOSPITAL UNIVERSITARIO
Introdução
Os profissionais de saúde trabalharam na linha de frente da pandemia do COVID-19 com papel essencial para o tratamento e recuperação dos indivíduos acometidos com o quadro, em um período cujo conhecimento sobre a patologia e seus mecanismos de transmissão ainda eram limitados. Tal cenário fez com que muitos profissionais adoecessem pelo uso inadequado dos equipamentos de proteção individual (EPI), excesso de horas trabalhadas e grande exposição, resultando em altos índices de absenteísmo nas instituições de saúde (1).
O Conselho Regional de Enfermagem afirma que todo serviço necessita trabalhar com margem de segurança, prevendo afastamento em casos de problemas de saúde, falecimento de familiares e acompanhamento em hospitalizações. No período da pandemia, muitos profissionais foram afastados por longos períodos, seja por infecção pelo vírus, seja por indivíduos sintomáticos ou por pertencerem a grupos de risco, impondo dificuldade para o setor de gestão. Além disso, foi um período com aumento nas taxas de ansiedade e depressão pela sobrecarga física e emocional dos trabalhadores, sendo também motivo de afastamento que requeriu reinserção e acolhimento pela equipe no retorno às atividades profissionais (2).
Profissionais de saúde precisaram lidar diretamente com pacientes infectados em um contexto de desconhecimento, enfrentando sentimentos como ansiedade, medo, estresse e exaustão, evidenciando níveis moderados e graves de Burnout que agravaram o absenteísmo (3). Outros fatores inerentes à crise da saúde pública, como falta e inadequação de EPI's, protocolos incoerentes e medo de se infeccionarem, impactaram ainda mais a saúde mental desse grupo (4).
Metodologia/ Discussão
METODOLOGIA
Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Pernambuco CAAE: 32534620.0.0000.8807.
Trata-se de um estudo transversal de caráter descritivo que realizou uma análise quantitativa dos números de consultas ambulatoriais e de procedimentos cirúrgicos realizados pelo serviço de traumatologia do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Pernambuco no ano de 2020 em comparação com a média do período de 2016 a 2019. Os dados foram colhidos no setor de recursos humanos do mesmo hospital, sendo as cirurgias categorizadas por regiões anatômicas.
O corpo clínico foi quantificado em 09 médicos estatutários e 06 médicos celetistas, sendo dois profissionais com 02 vínculos (um estatutário e um celetista) e ainda 07 residentes do serviço de traumatologia. O corpo de enfermagem consistiu em 02 enfermeiras e 04 técnicos de enfermagem.
DISCUSSÃO
Os dados levantados evidenciaram queda expressiva na quantidade de consultas ambulatoriais e cirurgias realizadas pelo serviço de Traumatologia no contexto pandêmico, revelando uma prestação de serviço deficitária àqueles acompanhados no setor. De 2016-2019, a média de consultas e cirurgias por ano era, respectivamente, de 6.710 e de 414,2. No ano de 2020, foram realizadas apenas 2167 consultas ambulatoriais e 172 cirurgias, expressando uma queda de 67,7% e 58,5% em comparativo com os anos anteriores. Motta Filho (6) encontrou dados semelhantes em um Instituto Ortopédico de Alta Complexidade do Rio de Janeiro, no qual houve uma redução de 48,5% na produtividade cirúrgica e de 72,4% no atendimento ambulatorial em relação a 2019.
Tal cenário não se restringiu ao Brasil, sendo também evidenciado em um estudo multicêntrico conduzido por Trisolino e Colaboradores na Itália, que avaliou a variação nas atividades médicas e cirúrgicas no âmbito da Ortopedia Pediátrica durante a pandemia do COVID-19 em comparação com os 02 anos anteriores. Em 2020, houve queda de 23,7% nas atividades cirúrgicas, de 21,4% na quantidade de consultas e de 39,1% nas visitas ao departamento de emergência comparada ao período de 2018-2019 (9). Sendo assim, percebe-se que, apesar do impacto mundial da pandemia, o Hospital Universitário brasileiro avaliado no presente estudo apresentou queda mais expressiva do que o panorama global no que diz respeito a prestação de atendimento, com suas porcentagens de queda de 67,7% e 58,5%.
Um centro de referência em Trauma e Ortopedia no Peru apresentou uma redução de 79,9% no número de pacientes atendidos e de 30,9% no número de pacientes hospitalizados. A maioria das cirurgias eletivas realizadas no período foram por fratura osteoporótica de quadril e úlceras em pés diabéticos (10). Outro centro terciário da Espanha atestou redução significante no número de admissões no setor da emergência pela redução dos acidentes de trabalho, acidentes de trânsito e número de admissões hospitalares, especialmente durante o lockdown. Porém, afirmou também que não foram encontradas diferenças estatísticas na quantidade de admissões por fraturas osteoporóticas de quadril nesse período (11).
Além da mudança no panorama do serviço oferecido durante a pandemia, o absenteísmo de profissionais de saúde também exerceu um importante papel no âmbito da saúde pública. Uma análise feita na Grécia por Maltezou e Colaboradores demonstrou que de 254 profissionais de saúde com COVID-19, 49 (19,3%) foram hospitalizados por em média 12 dias e 252 (99,2%) (12) tiveram um índice de absenteísmo médio de 25,8 dias, significativamente maior do que o encontrado neste estudo, com média de 15 dias em caso de infecção. O impacto financeiro gerado pelo absenteísmo foi quantificado em quase 2 milhões de euros na Grécia e 1.3 milhões de dólares em hospitais afiliados a Universidade de Medicina em Mashhad, no Irã (13).
Com relação a função com maior risco de contrair COVID no contexto hospitalar, um estudo em um hospital universitário no Sul do Brasil demonstrou que assistentes administrativos possuíam menor risco de contrair a infecção, enquanto a equipe de enfermagem apresentaria maior risco (14), embasando, assim, o afastamento de 02 dos 06 indivíduos que compunham a equipe de enfermagem no presente estudo.
Marco Conceitual/ Fundamentação/ Objetivos
MARCO CONCEITUAL/FUNDAMENTAÇÃO
A repercussão financeira que a pandemia impôs ao Sistema Único de Saúde (SUS) foi intensificada pelo absenteísmo, como demonstrou um estudo realizado com os funcionários do Hospital Universitário Lauro Wanderley no período de março a dezembro de 2020. 39,65% (n= 793) dos servidores do hospital foram afastados por doença, por em média 6,6 dias, implicando em um gasto total de 2.603.017,95, sendo o maior custo expresso pelas doenças virais, seguida de transtornos mentais e comportamentais (5).
Apesar de nem todas as especialidades médicas lidarem diretamente com pacientes acometidos pelo coronavírus, todas sofreram impacto em decorrência das medidas implantadas pelas autoridades sanitárias e órgãos de controle, como suspensão de procedimentos eletivos. O setor de traumatologia e ortopedia é um exemplo, cujos procedimentos autorizados limitavam-se a tratamentos oncológicos, traumas ortopédicos, infecções e complicações pós-operatórias no Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia do Rio de Janeiro (6). Tais repercussões ultrapassaram as fronteiras Brasileiras e atingiram grandes centros de referência em ortopedia ao redor do mundo, como o departamento da Universidade de Padova, na Itália, em que cirurgias eletivas e consultas ambulatoriais não urgentes foram canceladas, resultando em redução de 30% na quantidade de cirurgias em relação a 2019 (7).
Um estudo comparando as variáveis hospitalares no pico da pandemia entre 16 de março e 30 de junho de 2020 com o mesmo período de 2019 demostrou afastamento de 231 colaboradores conforme a Portaria nº 428 do Ministério da Saúde. (6) Tal portaria dispôs sobre as medidas de proteção para o enfrentamento diante da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus, liberando para trabalho remoto indivíduos com 60 anos ou mais, imunodeficientes, portadores de doenças crônicas e gestantes, indivíduos que tiveram contato com pessoas sintomáticas ou apresentaram sintomas gripais e funcionários com filhos em idade escolar ou inferior que necessitem da assistência de um dos pais (8).
OBJETIVO
Nesse contexto de repercussões geradas pela pandemia do COVID-19, esse estudo visou quantificar o impacto do coronavírus na qualidade do atendimento oferecido à população pelo serviço de traumatologia de um Hospital Universitário do estado de Pernambuco no ano de 2020, em decorrência dos afastamentos profissionais e medidas governamentais impostas no período.
Resultados/ Conclusões
RESULTADOS
No ano de 2020, foram realizadas 2167 consultas ambulatoriais e 172 cirurgias pelo serviço de traumatologia, uma queda de 67,7% e 58,5% em relação à média de 6710 consultas e 414,2 cirurgias, respectivamente, no período de 2016 a 2019. As cirurgias da cintura escapular foram as mais afetadas com apenas 6 realizadas em 2020, representando uma diminuição de 85,8% da média de 42,25 feitas por ano entre 2016 e 2019. Em relação aos afastamentos, estiveram afastados 08 médicos estatutários por um período de 04 meses, devido à suspensão do semestre letivo. Dois médicos foram realocados para trabalhar no sistema de regulação de leitos, devido à faixa etária e à presença de comorbidades. Outros dois médicos foram afastados por um período de 15 dias. Todos os residentes afastaram-se por 15 dias em períodos distintos por terem sido infectados pelo COVID-19. No corpo de enfermagem, duas enfermeiras se afastaram por enquadrarem-se na faixa etária de risco por um período de 04 meses.
CONCLUSÕES
Conclui-se que os serviços médicos prestados à população no âmbito da traumatologia em 2020 no Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Pernambuco sofreram diminuição expressiva quando comparados ao quantitativo do período de 2016 a 2019. O absenteísmo profissional associado às medidas restritivas governamentais foram responsáveis pela diminuição de consultas ambulatoriais e adiamento dos procedimentos cirúrgicos eletivos que seriam realizados no ano de 2020.
Considerações Finais
Dessa forma, espera-se que tais resultados possam guiar a implementação de estratégias nos serviços de traumatologia e ortopedia para suprir a demanda reprimida do ano de 2020.
Bibliografia
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Área
Auditoria Médica
Instituições
UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO - Pernambuco - Brasil
Autores
JOSE MIGUEL FRANCISCO DA SILVA SOUZA, PAULO CEZAR VIDAL CARNEIRO ALBUQUERQUE, IZABELLA CARVALHO DE OLIVEIRA, MARCELA VASCONCELOS MONTENEGRO, CLARISSA MIRANDA CARNEIRO DE ALBUQUERQUE OLBERTZ, PAULA EDUARDA MIRANDA CARNEIRO DE ALBUQUERQUE