Dados do Trabalho


Título

A DINAMICA RECENTE DO CULTIVO DA SOJA E CULTURAS ALIMENTARES NO BRASIL

Introdução

A soja é uma planta de origem Chinesa que foi adaptada às mais diversas regiões e climas. De seus múltiplos usos, do óleo de cozinha, do biocombustível ao concentrado proteico para rações, o cultivo dessa leguminosa tem sua demanda crescente para abastecer o complexo agroindustrial. Sua adaptação às diversas regiões do Brasil foi fruto de intensa pesquisa em melhoramento genético por instituições públicas. A forte expansão no cultivo no Brasil teve um conjunto de fatores favoráveis: as políticas públicas, as pesquisas em âmbito nacional, a tecnologia, os produtores pioneiros na região centro oeste, o potencial do país de terras cultiváveis e as demandas da globalização, sobretudo do mercado chinês. O cultivo da soja no Brasil vem crescendo há mais de 30 anos e mudou o cenário da geografia econômica, superando os ciclos anteriores, como do pau-brasil, da cana de açúcar e do café (DUCLÓS, 2014). Na safra 1999/2000 foram cultivados 13,69 milhões de hectares no Brasil, enquanto em 2019/2021 foram cultivados 38,3 milhões de hectares, aumento superior a 260% no período, ou seja, mais de um milhão de hectares de incremento da área cultivada por ano. Com a evolução recente, desde a safra 2019/2020 o Brasil se consolida como maior produtor e exportador mundial.

Resumo

Nos últimos 20 anos estão sendo incorporados anualmente à produção da soja no Brasil cerca de 1,2 milhão de hectares. Além da demanda internacional, a forte expansão no cultivo da soja no Brasil está associada com a implantação de políticas públicas de crédito rural subsidiado e à desoneração de insumos agroquímicos e fertilizantes. O investimento público em pesquisa agropecuária potencializou o desenvolvimento da soja com cultivares adaptadas às diversas regiões brasileiras e o cenário construído pela pesquisa e desenvolvimento nacional tornou o país no principal exportador mundial atendendo a demanda crescente, sobretudo da China. O artigo propõe investigar possíveis impactos do avanço da soja, em especial em itens alimentares que afetam diretamente a segurança alimentar e nutricional da população. A partir de análise do comportamento da produção agrícola disponibilizadas pelo IBGE, é possível observar que concomitante ao avanço da soja, houve decréscimo significativo das áreas de cultivo das culturas alimentares típicas como o arroz, feijão e mandioca, o que desperta a preocupação com o abastecimento interno e a segurança alimentar do país, uma vez que, a disponibilidade interna destes produtos teve significativa redução no período.

Objetivos

O artigo tem como objetivo investigar possíveis impactos do avanço da soja, em especial em itens alimentares que afetam diretamente a segurança alimentar e nutricional da população. A partir de análise do comportamento da produção agrícola disponibilizadas pelas bases de dados consultadas.

Material e Método

Foi realizado estudo quantitativo e descritivo da produção agrícola nacional e catarinense de: soja, arroz, feijão e mandioca nas safras de 2000 a 2021. O levantamento de informações de área e produção foi realizado nas plataformas consolidadas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Pesquisa Agrícola Municipal (PAM), SIDRA e Levantamento Sistemático da Produção Agrícola (LSPA) que fornecem estimativas de área plantada, área colhida, quantidade produzida e rendimento médio de produtos selecionados com base em critérios de importância econômica e social para o país. As informações obtidas são de safras fechadas, no entanto, da safra 2020/2021 as estimativas foram do último relatório do IBGE (Julho, 2021). O estudo se baseou principalmente nas informações de área plantada e produção total nos anos apresentados, as análises foram fundamentadas em ampla revisão da literatura relacionada ao tema.

Resultados e discussão

A área cultivada de soja no Brasil apresentou aumento significativo, mais de 185% no período desde 2000, quando foi cultivado 13,69 milhões de hectares, enquanto que em 2021 alcançou 38,73 milhões de hectares. Nesse período, foram incorporados mais de um milhão de hectares por ano. A expansão da área, aliada ao aumento da produtividade mais que triplicou a produção no Brasil, tornando o maior produtor e exportador mundial de soja (USDA, 2021).
Por outro lado, as culturas para alimentação básica como feijão, mandioca e arroz apresentam sistematicamente redução em suas áreas de cultivo. Conforme o Gráfico 1, a retração da área do cultivo do arroz, feijão e mandioca entre 2000 e 2021 foi de, 54,8%, 38% e 24,1% respectivamente, sendo essas, espécies que geram a base da alimentação da população. Assim, pode-se afirmar que o forte aumento da área cultivada com soja vem ocorrendo paralelamente com a diminuição de áreas de cultivo de produtos alimentares. A consequência da retração da área de cultivo de feijão e mandioca está na diminuição da produção destes produtos nos últimos 20 anos. No caso do arroz, ainda há uma certa estabilização do total produzido em função da melhoria da produtividade com o deslocamento do plantio de sequeiro para arroz irrigado.
Na cultura da mandioca, a forte redução na produção justifica-se em parte pela redução na demanda para o consumo animal que foi substituído pelas rações balanceadas e a mistura de 2% de farinha de mandioca na panificação que se tornou inviável com a importação de farinha de trigo altamente subsidiada na década de 90 (GROXLO, 2019). Na sequência, a escassez de mão de obra que também dificulta a expansão de culturas que ainda não são totalmente mecanizadas. O feijão também se enquadra nesta situação, levando ainda em consideração a forte oscilação nos preços já que é uma espécie muito sensível a fatores climáticos. O Instituto Brasileiro do Feijão (IBRAFE) alerta que “É preciso urgentemente enxergar que estamos caminhando errantes para a insegurança alimentar, ora sobrando, quebrando produtores, ora faltando e desestabilizando orçamentos do brasileiro”. Também complementa sobre a necessidade de planejamento do setor para que tenhamos previsibilidade e equilíbrio no setor. Ainda se faz necessário implementar políticas públicas para promover maior diversificação da produção para abastecimento interno e segurança alimentar do país. Quando considerado o crescimento da população brasileira, as disponibilidades internas dos produtos da alimentação básica foram reduzidas substancialmente. Tomando como exemplo o feijão, a disponibilidade interna passou de 18,05 para 12,67 kg/habitante/ano, considerando a produção relativa de feijão e habitantes nos períodos referenciais de 2020 e 2021. Há necessidade de que sejam realizadas pesquisas que abordem questões como: a diminuição do consumo nas diferentes faixas da população, a mudança de hábito e, se os preços elevados em alguns momentos restringem a acessibilidade ao produto a toda população (EMBRAPA, 2019).
O Instituto Brasileiro do Feijão - IBRAFE alerta que “É preciso urgentemente enxergar que estamos caminhando e situações errantes para a insegurança alimentar, ora sobrando, quebrando produtores, ora faltando e desestabilizando orçamentos do brasileiro”. E complementa sobre a necessidade de planejamento do setor para que tenhamos previsibilidade e equilíbrio no setor (IBRAFE, 2020). Ainda se faz necessário implementar políticas públicas para promover maior diversificação da produção para abastecimento interno e segurança alimentar do país.
A FAO tem apresentado estudos sobre a questão da segurança alimentar e aspectos do avanço da produção da soja, no artigo: “FAO Commodities and Trade Division, Basic Foodstuffs Service” (consulta em 2021) . O estudo confirma a importância atual e provável posição futura da soja para nutrição humana em âmbito global. No entanto, também mostra que determinar a contribuição da cultura para combater a fome em países em desenvolvimento, pobres e com insegurança alimentar e dependentes de importações, é uma tarefa complexa que pode levar a resultados diferentes, dependendo do país envolvido. O estudo revela que a discussão de questões de segurança alimentar usando uma perspectiva global de mercadoria única, como a commodity soja, enfrenta sérias limitações.

Conclusões/Considerações Finais

A consultas das fontes de dados disponíveis permitiu dimensionar a evolução recente das áreas para cultivo de soja em comparação com os demais cultivos alimentares no Brasil. A expansão do cultivo da soja no Brasil acontece sistematicamente nos últimos 20 anos, período em que, mais de um milhão de hectares são incorporados anualmente a produção da oleaginosa, a elevada liquidez e forte demanda internacional, estimulam seu cultivo. Por outro lado, houve decréscimo significativo das áreas de produção de culturas alimentares típicas como o feijão, arroz e a mandioca, o que desperta a preocupação com o abastecimento interno e a segurança alimentar do Brasil, considerando a redução significativa da disponibilidade interna dos produtos da alimentação básica. Há necessidade de estudos complementares para investigar as causas da redução do consumo doméstico destes produtos e fatores correlacionados.

Referências Bibliográficas

DUCLÓS, N. A marcha do grão de ouro. Soja: a cultura que mudou o Brasil. Florianópolis: Editora expressão, 2014. 144p.

EMBRAPA. Especialistas comentam polêmico declínio do consumo de feijão no Brasil. Disponível em: https://www.embrapa.br/busca-de-noticias/-/noticia/42217659/especialistas-comentam-polemico-declinio-do-consumo-de-feijao-no-brasil. Notícias, 23/03/2019. Acesso em 08/09/2021.

FAO. The role of soybean in fighting world hunger FAO. Commodities and Trade Division. Disponível em: http://www.fao.org/3/bs958e/bs958e.pdf. Acesso em: 30/08/2021.

GROXCO, M. Mandioca, Análise da Conjuntura. Departamento de Economia Rural – DERAL Prognóstico. Disponível em: https://www.agricultura.pr.gov.br. Acesso em 27/08/2021.

IBGE. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Produção agrícola MUNICIPAL - PAM. Rio de Janeiro: IBGE, 2021. https://sidra.ibge.gov.br/tabela/5457. Acesso em: 20/08/2021.

IBRAFE. Brasil perde produtores de Feijão e arrisca a segurança alimentar. 20.11.2020. Disponível em: https://www.ibrafe.org/?s=inseguran%C3%A7a+alimentar. Acesso em 8/09/2021.

MDIC, COMEX-STAT. Disponível em: http://comexstat.mdic.gov.br/pt/home. Acesso em: 26.08.2021.

USDA. Oilseeds: World Markets and trade. Global Market Analysis. Foreign Agricultural Service August 2021. Disponível em: https://www.fas.usda.gov/data/oilseeds-world-markets-and-trade. Acesso em 20/08/2021.

Palavras Chave

soja, feijão, arroz, segurança alimentar.

Arquivos

Área

Grupo VII: Gestão e economia rural

Instituições

Epagri-Cepa - Santa Catarina - Brasil

Autores

HAROLDO TAVARES ELIAS, JOÃO ROGÉRIO ALVES, MARINA MARLY DALLA BETTA